quinta-feira, 20 de maio de 2021

Honrar os militares em Oliveira de Frades com a inauguração de um Monumento---

Relembrar para não esquecer Oliveira de Frades, 15 de Maio de 2021 Inauguração do Monumento de Homenagem aos ex- Combatentes Nós estamos aqui, porque estivemos lá nas agruras de uma África que fez doer, mas, ao mesmo tempo, deixou um não seu quê de saudade. Falamos de uma África sofredora, mas geradora de sentimentos humanos do mais puro que se possa imaginar: cada passo nela vivido traz-nos à memória a força de uma generosidade sem limites. Ali, ninguém era ninguém em si mesmo, cada um de nós era um todo que NUNCA poderia ficar para trás. Nem que tivesse de ser trazido em braços, como tantas vezes, infelizmente, teve de acontecer, na dor, nas lágrimas, mas também na vontade de escrever a entrega a cada irmão e camarada ao mais alto nível e no mais alto grau. Nós estamos aqui, mas naquela placa , ali, estão irmãos nossos que foram daqui com vida, pujante e cheia de sonhos, e acabaram por regressar sem ela, embrulhados em simples e frias quatro tábuas de um destino cruel. Temos de recordar o Álvaro Lopes Ferreira, o Anselmo Tavares Poeta, o António Duarte Nunes, o Carlos Dias da Silva, o Fernando Rodrigues, o José Luís Fernandes, o Celso de Jesus, o Franklin Antunes, o Nelson Martins Corga, que tombaram por aquelas longínquas paragens e os nossos camaradas que, por força de um destino e de uma morte que a todos nos espera, já aqui não podem estar connosco. E tantos eles foram… Todos aqueles que aqui não estão deixaram famílias em lágrimas, umas vendo partir os seus entes queridos em pleno Ultramar, outras assistindo à sua morte já por estas nossas bandas, no triste andar dos tempos. Estamos aqui também com toda essa nossa gente. Lá, na África distante e quente, uma das virtudes que aprofundámos foi a da solidariedade e a do não esquecimento. Por isso, este nosso encontro em Homenagem a quem andou naquela Guerra é também uma evocação que vai para além de quem vestiu a farda, pois engloba, nessa enorme família, quem, na rectaguarda, passou anos e anos em doloroso sofrimento, angústia e incertezas tamanhas. Olhando em redor, recordamos ainda todos aqueles que trouxeram marcas que fizeram com que suas vidas nunca mais fossem o que antes tinham sido. Evocamos os nossos irmãos feridos, com deficiências, umas visíveis outras mais silenciosas, mas também duríssimas, como o stress de guerra. Este Monumento aqui está para recordar tudo isso, todos esses tempos que a História jamais poderá apagar. Este gesto, este acto levado a cabo pela Câmara Municipal da nossa terra, num executivo liderado pelo Paulo Ferreira ( o nosso Paulito) e, neste caso, bem apoiado no seu Vice-Presidente, o Coronel Carlos Pereira, que soube ler, nas linhas e nas entrelinhas, o que foram esses tempos de juventudes espalhadas pelas matas de uma Guerra, feita de tudo menos de certezas, devido ao seu carácter de guerrilha, tem para nós, gerações dos setenta e dos oitenta anos, a malta dos cabelhos grisalhos, um significado de um extraordinário alcance. A obra de arte que o Engenheiro e Arquitecto José Paulo Loureiro aqui nos lega é bem o testemunho da grandeza de espírito de toda esta gente que se uniu a todos nós neste esforço comum de recordarmos quem viveu essas pesadas horas, dias, meses, anos, muitos anos de uma Guerra que praticamente ninguém relembra com orgulho, mas que também nos não envergonha nem pesa nas nossas consciências . Foi, porém, a marca de um tempo que é tempo da nossa História comum e como tal não pode nunca ser renegada, nem esquecida. Nós, aqueles que nela participámos, também não nos sentimos como alguém que fez o que não devia. A chamada a um destino, o desse tempo, impôs-se. Fomos. Isso fomos. E viemos e aqui estamos de cara levantada, unidos, todos nós, numa camaradagem que só a sabe explicar quem a viveu na sua plenitude e grandeza. Por termos dado esses passos, sentimos que estas homenagens, patrocinadas ao mais alto nível, o da nossa Governação, nos aquecem o coração e são mesmo um acto de justiça nacional… Aqueles foram tempos feitos de vários tempos, como bem disse o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que para sempre marcaram a vida de mais de um milhão de jovens, nós aqui presentes e muitos, muitos outros, de suas e nossas famílias e de seus e nossos lugares. Aqui estamos nós, no chão que nos viu nascer e crescer, estas terras do nosso concelho de Oliveira de Frades, em evocação, homenagem e numa jornada de intensa dor, porque nada pode fazer esquecer quem, ali em placas inscrito, deu a vida ao serviço da nossa pátria portuguesa. Estamos aqui, repetimos, porque estivemos lá. Apresentamo-nos neste lugar sagrado de memórias doridas de peito aberto e nunca de corda ao pescoço. O facto de termos pisado o chão da Guerra não nos diminuiu, nada disso. Foi tão só e apenas a resposta ao nosso tempo. Nós respondemos com o sim da nossa aceitação. No meio de lágrimas, partimos um dia sem saber se e como voltaríamos. A história chamou-nos e nós não a recusámos. Felizmente, que um dia, moldado todo ele na argamassa desses tempos de sofrimento, acordámos num país novo. No meu caso, o 25 de Abril de 1974 só o vim a conhecer no dia 26, ao outro dia e, mesmo assim, todo ele ainda carregado de pontos e mais pontos de interrogação. A história, a nossa história, é assim um mundo de um antes, o vivido na crueldade da Guerra, e um depois, por termos vindo em Outubro de 1974, já vivido em democracia. Aos militares, a todos nós, têm de ser creditados esses dois tempos. Fazê-lo é uma forma de ler o passado com a grandeza de carácter de quem por lá andou. E nada pode ser olhado por prismas de outros tempos. Aquela foi a nossa época. Esta, a de agora, e a de hoje, no nosso querido concelho de Oliveira de Frades, é a da recordação, do tributo, da homenagem, da gratidão e da memória. Falando um pouco em nome próprio, a honra de ter sido escolhido por meus irmãos e camaradas de Guerra e pela Câmara Municipal para aqui, aqui neste lugar que para todos nós passa a ser uma espécie de altar do culto da amizade e da saudade, usar da palavra, enche-me de orgulho, mas também de um temor: o de não ter sido capaz de pôr em palavras tudo o que vai na alma de todos nós. Nunca saberei se estive à altura de abraçar, em sentimento de pesar, as famílias e os amigos de quem, na flor da juventude, se despediu de todos nós. Creiam, porém, que tentei ser fiel às minhas ideias e aos princípios que me norteiam, como sejam os de sempre honrar quem merece ser apreciado pelo que fez e por tudo quanto deu à sociedade. E, nós, militares da Guerra do Ultramar, demos tudo o que pudemos dar. Foi neste sentido que esta Comissão dos Ex- Combatentes do concelho de Oliveira de Frades se lançou nesta aventura. Obrigado a todos quantos souberam interpretar desta maneira nobre a história, a nossa história… Hoje, Dia da Família, esta é a nossa Família alargada. Que, com este espírito, continuemos no futuro. Carlos Rodrigues