quinta-feira, 9 de maio de 2019

O Interior com valor

O valor do nosso Interior Há dias, em sessão dedicada aos temas do turismo e do empreendedorismo, alguém disse que o luxo do século XXI, este que estamos a viver há dezanove anos, vai ser o Interior do país. Ou seja: para lá dos Algarves e de outros nichos que têm feito história a este nível, escrevendo eles a maioria das páginas desse sector que o resto é paisagem, as nossas terras e todas aquelas que vivem um destino comum, o do continuado esquecimento, vão dar cartas daqui a algum tempo. Sendo tarde demais, ainda é possível oferecer, pelo menos às gerações vindouras, territórios com uma nova vida e com uma conseguida nova esperança. Assim o esperamos. Na análise dos dados sobre turismo na Região Centro, essa tendência de crescimento sustentado é já uma evidência. Há mais procura, há mais estadias, há muito mais oferta e, por isso, cada um de nossos recantos converte-se em pólo de interesse para quem nos visita. As modernas redes sociais, o passa a palavra, a divulgação feita pelo Turismo do Centro têm, aqui, um relevante papel. Também a capacidade empreendedora de muita da nossa gente entra, a fundo e a sério, nesta boa equação. Entretanto, como lemos há dias num excelente trabalho sobre a falta de aproveitamento da albufeira da Barragem de Ribeiradio, por uma profunda falta da bom senso das entidades que têm nas suas mãos o respectivo Plano de Ordenamento, que nunca mais sai do papel, é travão incompreensível. Para se avaliar o que será aquele espaço, mal seja dada luz verde para a sua correcta utilização, basta que se olhe, por exemplo, para as Barragens da Aguieira e do Castelo do Bode, onde proliferam investimentos turísticos de excelência. Um dia, por aqui, esses sonhos serão uma realidade, tal como todos desejamos. Enquanto no Vouga a inércia tem feito o seu mau caminho, pelos outros espaços da nossa região muito tem sido levado a cabo. Cresce o turismo de habitação a olhos vistos. Modernizam-se as nossas terras, conservando-se, em muitos casos, tudo aquilo que há a preservar. Lutando contra a fatalidade das destruições provocadas pelos incêndios de Outubro de 2017, a coragem para a recuperação necessária e sua valorização têm estado na ordem do dia. A vitalidade das Termas de S. Pedro do Sul mostra-se bem alto. As nossas Serras e Rios são pontos de inegável interesse. Sendo o turismo altamente importante, deve haver toda a cautela, no entanto, em não fazer desse sector a galinha dos ovos de ouro. Se enveredarmos por essa via, um dia ficamos, possivelmente, com uma batata quente nas mãos: a de estarmos na mata sem cão, porque a dependência económica de um só factor é política que dá sempre mau resultado. Lafões tem complementaridade para ir mais além: tem bons solos, boas carnes, boa capacidade empresarial, boas tradições, razoáveis ou mesmo boas vias de comunicação, mas ainda não fez todo o caminho que está ao seu alcance. A agricultura e a floresta, por exemplo, são aspectos que têm de levar uma grande volta e é também aí que está a chave para a recuperação das nossas aldeias e das nossas terras. Sem isto acontecer, será em vão qualquer esforço que se faça. Com povoações despidas de gente, não temos futuro, porque o presente não lhe está a dar a devida atenção. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, 28fev19

Lena Liz ilustrou livro sobre Fernando Pessoa

Em Espanha lançado livro com marca lafonense Helena Liz Dias é uma pintora com uma vasta obra espalhado um pouco por todos os cantos do mundo, muito especialmente em Espanha e Portugal, onde tem residido, ora num lado, ora noutro. Neste nosso país, é em Vouzela, terra de seu marido, António Liz Dias, que passa a maior do seu tempo. Sempre muito reconhecida no mundo da arte, vê agora uma sua pintura ser capa (a que junta ainda a ilustração) de um livro, editado em Espanha, dedicado à obra de Fernando Pessoa e ao 130 º aniversário de seu nascimento. Intitulado “ Los cuentos que Pessoa no escribió – Antologia que celebra el 130 aniversario de su nacimiento”, será lançado no próximo dia 12, em Madrid. Nele participam 25 autoras de 10 países iberoamericanos. Em ambiente de homenagem à figura ímpar de Fernando Pessoa, a apresentação desta antologia será feita por Pedro Berhan da Costa, conselheiro cultural da embaixada de Portugal em Espanha, havendo ainda declamação da poesia daquele autor português e uma sessão de fados, protagonizada por Verónica Aranda, uma das colaboradoras desta colectânea. Em edição bilingue, portuguesa e espanhola, a respectiva selecção e a edição devem-se a Mayda Bustamante e Gabriela Guerra e a ilustração, como dissemos, à nossa conterrânea Helena Liz. Se Fernando Pessoa tem a projecção que bem se conhece, a chamada desta nossa pintora para a ilustração deste importante livro é mais um destaque que saudamos. Reconhecida em cada uma das nações ibéricas, em 2005, na Embaixada de Portugal em Espanha, recebeu uma alta distinção, a Comenda da Ordem do Infante D. Henrique. Buscando as raízes da sua pintura nela própria, dissse um dia: “ O que me inspira é a vida, a minha vida. Todos arrastamos uma biografia. Somos vida e é isso o que mais me interessa”. Cremos que foi esta postura e esta dedicação que colocou, agora, na obra de Fernando Pessoa. Recordamos as comemorações dos seus 40 anos de carreira, em 2012, realizadas no Museu Municipal de Vouzela, vila e concelho que adoptou como seus, muito embora tenha nascido no Sabugal, Guarda. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, 8nov18

sexta-feira, 3 de maio de 2019

Feriados e seu significado: S. Frei Gil, Vouzela.

Estes são tempos em que os chamados dias de descanso fazem parar meio mundo. Dois deles, de carácter nacional, o 25 de Abril e o 1º de Maio, remetem-nos, um, para fenómenos praticamente só nossos, as gentes de alma lusa, e outro mostra-se quase transversal a todo o mundo, mais ou menos intensamente, o do Dia do Trabalhador. Finalmente, no que toca a Vouzela, há ainda que contar com o S. Frei Gil, 14 de Maio, feriado municipal, com uma fronteira que vai de Alcofra a Queirã e do Vouga ao Caramulo. Conquistas da modernidade, a comemoração destas datas especiais ainda não percorre todo o nosso tecido social, longe disso. Por estarem todos os serviços públicos e muitos estabalecimentos comerciais fechados, dá-se conta que algo de anormal, a romper com a rotina, por aqui está a acontecer. Como comunidades rurais, quando muito, não se cumprem os trabalhos no emprego, mas as tarefas domésticas continuam. Ganham força, nestes dias, as batatas que vão para a terra criadora. Enquanto assim acontece (e esta realidade não pode ser desmentida porque os factos tal comprovam), convém não esquecermos que cada umas destas datas tem o seu significado especial. A 25 de Abril, fomos, este ano, convidados a recuar quatro décadas e meia certinhas, para relembrar a vinda de novos tempos, com todas as suas virtudes, muitas, e defeitos, bem menos. No dia 1 de Maio, ontem, tivemos em mente o que os trabalhadores conseguiram conquistar pela força do querer e determinação de tantos nossos antepassados que deram a vida para que tal fosse possível, quanto a dignidade do mundo de quem labora fortemente e com esperança num futuro melhor. Finalmente, olhando para o município de Vouzela, a 14 de Maio, celebra-se a figura de S. Frei Gil, um beato/santo, que foi marcante na sua época, sobretudo no século XIII, e que nesta terra nasceu, acabando por morrer em Santarém no dia 14 de Maio de 1265. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, Maio 2019

A saúde, primeiro, a ideologia depois...

Lafões, terras de solidariedade Hoje, andamos todos afadigados em discutir o Serviço Nacional de Saúde e muito preocupados (e ainda bem!) em resguardar a necessidade de todos, mas todos, termos direito a sermos tratados com dignidade, eficiência, qualidade e sem quaisquer excepções. Tudo bem e que assim seja. Mas deixem que diga: para nós é algo indiferente que seja o Estado, directamente, a prestar esses cuidados ou quaisquer outras entidades, desde que o cidadão, todos nós, saia beneficiado e nunca marginalizado. A universalidade e a tónica têm que ser colocadas nos resultados finais, jamais em modos de estatização ou privatização de quem se venha a dedicar a essa gigantesca tarefa de pôr toda a gente com boa saúde. A ideologia, aqui como em muitos outros aspectos, deve ficar na gaveta, desde que os protagonistas em causa sejam capazes de desempenhar, com eficiência e humanidade, as duras tarefas que têm em mãos. Sem querer que possamos aliar o que vamos dizer aos tempos que correm, e jamais nos passaria pela cabeça fazer essas extrapolações, épocas houve em que o Estado nem sequer pensava nestes temas. De mão beijada, continuava a entregá-los à Igreja e às diversas confissões religiosas e daí lavava as suas mãos, porque aquelas entidades os tinham assumido desde a antiguidade. A nossa região de Lafões oferce-nos testemunhos desta realidade desde leste a oeste e de norte a sul, vindos, muito em especial, dos séculos XII em diante. Na linha que cruza o litoral com as serranias da Beira, desde logo, encontramos a Albergaria de Reigoso, em plena estrada romana e rota dos peregrinos de S. Tiago, com apoios de saúde e primeiros socorros no seu Hospital, que se manteve em funcioamento durante cerca de oito séculos. É obra. Mais além, as Caldas do Banho prestavam idênticos cuidados. No sentido norte-sul, Manhouce parece que suportou uma unidade deste género. E nas redondezas outras teriam existido, mormente em Doninhas/Talhadas, onde ainda hoje se vê a Rua do Hospital. No século XX, são notórios os serviços médicos, e até cirúrgicos, praticados pelas Misericórdias de Oliveira de Frades, Vouzela e S. Pedro do Sul. Num esforço titânico das diversas comunidades, cada tostão tinha muito do suor dos nossos conterrâneos e antepassados, que estavam sempre dispostos a ajudar e a contribuir, muitas vezes mesmo em tom de festa, como sejam os cortejos de oferendas que se iam realizando de vez em quando e com participação e sucesso assinaláveis. Se S. Pedro do Sul e Oliveira de Frades são unidades muito mais recentes, de fins dos séculos XIX e anos trinta do século XX, a Misericórdia de Vouzela ostenta centenas de anos de história, por ter sido lançada em Agosto de 1498 na Sé Catedral de Lisboa, no reinado de D. Manuel I. Achamos bem, para finalizar, que a saúde mereça toda a atenção dos nossos políticos, dispensando apenas a esterilidade fantasmagórica de alguns excessos, como dissemos, demasiado ideológicos e pouco práticos. Se o sonho comanda a vida, eles nem sempre sabem tudo e é nossa obrigação mostrarmos as nossas opiniões. Se as ouvem ou lêem, isso é outra conversa, mas fica-nos a consolação de termos cumprido o nosso dever: opinar. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, Maio 2019