terça-feira, 23 de julho de 2019

Lafões a mexer, a força da sociedade civil

A força da sociedade civil Há semanas que têm tudo para jamais se esquecerem, por este ou aquele motivo. Culturalmente, os últimos dias, e primeiros deste mês de Julho, tiveram um forte impacto a esse propósito. Em Viseu, viveram-se com emoção os momentos em que se pretendeu valorizar e divulgar a doçaria lafonense com dois emblemáticos produtos em concurso: o fortíssimo e velhinho Pastel de Vouzela e o recém-criado Pão de Ló de Milho com sumo de limão, de Sul. Um e outro foram objecto da votação de quem assistiu a esse programa, nesse dia e mesmo noutras alturas. Dizem-nos que ambos ficaram pelo caminho, um deles, o rei dos reis da nossa doçaria, por uma pretensa unha negra. Sem pensarmos no resultado final, falou-se de Lafões e isso tem um forte sentido positivo, ao mostrar que existimos, que mantemos as tradições seculares e somos, ao mesmo tempo, capazes, de inovar. Num outro patamar, sem honras de televisão nacional, a escolha dos eventos em que participar tornou-se um difícil exercício de agenda: olhando para um lado e para outro, em qualquer sítio, a animação cultural, por força dos agentes locais da nossa sociedade civil, impunha a nossa presença. Cambra, cheia de experiência nessas lides, não quis perder pitada dessa fama, oferecendo uma Feira Medieval que já tem um lugar marcado em tudo quanto seja programação associativo das nossas terras, e que deliciou quantos participaram neste evento ou assistiram aos muitos espectáculos ali realizados. Num ambiente de sonho e fantasia, com a secular Torre, a Praia e o Parque Fluvial de Cambra de Baixo, e as muitas pessoas que tudo deram de si para mostrar tradição e recriação histórica, ali se viveram dias e momentos de alto interesse patrimonial e cultural. Na vila de Oliveira de Frades, essa notável instituição que se chama ASSOL, que estende a sua acção por um vasto território, pôs no terreno, por ocasião das comemorações dos seus trinta nos de vida, o arrojado ASSOLFEST e viu coroado de êxito todo esse seu esforço. Durante um fim de semana em cheio, trouxe a alta e boa música, as artes diversas, numa extensa mobilização que passou pelas gentes da Sede, de S. Pedro do Sul, Vouzela, Castro Daire, Vila Nova de Paiva, Viseu, Tondela e Mortágua, localidades onde desenvolve, em termos de delegações activas, a sua vasta actividade em prol das pessoas com deficiência, na ordem de um milhar de gente apoiada. Nesta mesma localidade, a sede do concelho, a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários, aos noventa anos, comemorou o seu padroeiro, S. Marçal, em festejos religiosos e oficiais, sendo esta parte vivida, em almoço convívio e sessão solene, em Chão de Vintém – Arcozelo das Maias. Vivendo agora já na sua casa recuperada, a (re)inaugurar dentro de algum tempo, estes soldados da paz tiveram, assim, mais uma de suas datas importantes. Na Sobreira, Ponte e Feira, pela mão da UMJA, a sua filarmónica, houve o desfile e concerto em termos de um encontro de Bandas com a anfitriã e a de Lobelhe de Mato, Mangualde, isto no sábado, para, no domingo, se desenrolar o programa das suas Festas Populares. Pela mão da Liga dos Amigos de Vilharigues, realizou-se ali a Caminhada dos Moinhos, a culminar num almoço convívio, que juntou três dezenas de participantes na Torre, tendo-se percorrido terras de Paços de Vilharigues, S. Vicente de Lafões e Vouzela. Andou-se, essencialmente, em redor do Rio Mezio e suas azenhas, muitas delas concentradas, em grande escala, entre a Sernadinha e Ameixas, infelizmente, com alguns destes imóveis em degradante estado de abandono. Esta foi uma semana de altos voos. Ainda bem que assim acontece. Carlos Rodrigues, NV, Jul2019

sexta-feira, 19 de julho de 2019

Canta, canta, Lafões...

Lafões a cantar desde sempre Giacometti e José Fernando Oliveira em bons registos Com o Verão, vêm para a rua as energias populares em termos festivos, que se espalham pelos arraiais das diversas romarias, pelos templos e adros, pelas ruas onde passam as muitas procissões, pelos campos quando se sacham os milhos, se regam as propriedades e, lá para o Outono, se fazem as colheitas. Se, nos tempos chuvosos e frios do Inverno, a lareira e os serões são o palco privilegiado para esta manifestações ancestrais da cultura do nosso povo, nestes tempos de sol e longos dias, com as noites a serem um convite para se gozar, em entretenimento, a sua razoável e agradável frescura, é nos largos de nossas aldeias que se soltam todas as alegrias. Para as provar, a música é uma das grandes vias e um dos poderosos meios para mostrar ao mundo tudo aquilo que nos vai na alma. Em Lafões, sempre se cantou, cruzando influências, como em Manhouce, localidade que tem vindo a potenciar, ao máximo, este notável espólio, sobretudo para nos mostrar a passagem dos almocreves e suas paragens, em noitadas animadas, nas eiras daquela terra serrana, dançando-se e cantando-se em conjunto, povos do mar e da serra. Nasceu desta simbiose a pátria da música regional que temos como bom legado e que se espalhou por toda a parte, batendo também, muito em especial, à porta de Cambra (Vouzela), S. Félix (S. Pedro do Sul) e Santa Cruz (Arcozelo das Maias/Oliveira de Frades) Numa vertente diferente, as nossas Bandas Filarmónicas, algumas a passarem por três séculos de existência, desde os anos de 1800 até aos dias de hoje e com muito futuro pela frente, são a outra componente musical e cultural que nos caracteriza, assim como, em medida bem mais reduzida, os Grupos Folclóricos. Em prateleiras diferentes, encontramos ainda as canções religiosas, como as Janeiras, o amentar as almas, etc. Descobrindo as nossas riquezas, por aqui andou, de gravador e câmara em punho, Michel Giacometti (1929 – 1990), o corso, que se enamorou e apaixonou pela música tradicional portuguesa. Assinalando-se, este ano, os noventa anos do seu nascimento e os sessenta da sua chegada a Portugal, o nosso país e a região de Lafões têm para com ele uma dívida de gratidão Vindo para estas terras lusas em busca de cura para a sua tuberculose (1959), desde logo impôs o seu talento, a ponto de, na então Emissora Nacional e na RTP, os seus serviços e arte jamais serem desperdiçados. Entre as várias pessoas que com ele se cruzaram, uma delas, Fernando Lopes Graça, é inquestionável. Com este vulto da nossa música, surgiu a “ Antologia da Música Regional Portuguesa”, depois de Michel Giacometti ter fundado os Arquivos Sonoros. Duas de nossas terras, Manhouce e Cambra, receberam a sua preferência, quer, na RTP, 1972, com o “Povo que canta”, filmado precisamente em Cambra, quer noutros programas e ocasiões. Também Manhouce integrou o seu Cancioneiro Popular Português. A uma escala mais local, mas plena de importância e pertinência, trazemos ainda aqui o “Cancioneiro Regional de Lafões”, com recolha e coordenação de José Fernando Monteiro de Oliveira, 2000, com CD, uma notável e diversificada obra que muito engrandece e prestigia a nossa cultura e bibliotecas. Numa diversificada e muito abrangente pesquisa e registo, as 616 páginas de texto, letras e partituras fazem perdurar no tempo quem somos e o que cantamos, como memória de um rico passado e a ponte cultural segura para nos continuarmos a afirmar no mundo pelos tempos fora. Com os seus “cantares de carácter religioso e profano”, ali temos matéria de sobra para nos conhecermos melhor. E ir desfrutando vezes sem conta. Seria um erro grave e uma omissão imperdoável se, ao falarmos de música em Lafões, nos esquecêssemos de Isabel Silvestre e de tudo quanto ela faz e tem feito em favor da nossa cultura e região. Só o seu nome daria para encher as páginas de muitos jornais. De qualquer modo, esta singela nota apenas quer fazer registar o apreço e consideração que por ela temos. E que merecidas são estas curtíssimas referências. Aí temos o Verão. Vamos à música, a nossa, porque vale sempre a pena e a nossa alma não é pequena. Muito pelo contrário. Carlos Rodrigues, Notícias de Lafões, Jul 2019

1941, arborização da Serra do Ladário

Um projecto de arborização de 1941 para a Serra do Ladário Na Direcção-Geral dos Serviços Florestais, no ano de 2006, acedemos a um importante documento relacionado com o previsto aproveitamento da Serra do Ladário, em estudo que remontava a 1941, em termos da sua florestação. De notar que se estava, por essa altura, em plena época de ocupação de baldios e outros terrenos públicos com a vista à sua integração nos novos serviços então criados e que tanta celeuma vieram a originar. Numa área a ocupar que se estendia por 2150 hectares, eram nela incluídas as freguesias de Arcozelo das Maias, Ribeiradio, Reigoso, Destriz, Cedrim, Talhadas e Campia, em pleno contrafortes da Serra do Caramulo, com uma exposição francamente marítima e com abundante precipitação pluviométrica, como se pode ler no projecto em causa. Com uma vegetação natural à base de tojo arnal, carqueja, queiró e fetos ordinários, destavam-se, nessa altura, como espécies florestais o pinheiro bravo, o sobreiro e o carvalho. Apontavam-se os seguintes usos domésticos e vicinais: apascentação de gado, apanha de mato para lenha e estrume. Falava-se em 9330 cabeças de gado ovino e caprino, assim distribuídas: Arcozelo das Maias – 1401 ovinos e 377 caprinos; Destriz – 943/448; Reigoso – 844/172; Ribeiradio – 966/570; Cedrim – 676/171; Talhadas – 1512/1251. Entre diversos dados, incluindo as referências a vencimentos de trabalhadores para roça e sementeiras de penisco (25 quilos) e de acácias (9kg), indicam-se ainda as distâncias entre espécies e covas, o que mostra os cuidados que se tinham na organização de todo este processo. Numa clara diferenciação de ordenados entre homens e mulheres (8 e 5$00, respectivamente), aludia-se também à jorna dos rapazes (4) e dos capatazes (10$00). No capítulo das obras, enfatizava-se a construção das Casas dos Guardas Florestais de Lameiras, Souto Maior e Santa Maria, assim como as propostas de novos caminhos e beneficiação de outros. Entretanto, no livro “ A floresta, práticas e perspectivas – Raízes para o desenvolvimento da floresta – Henrique Machado e Nuno Amaral, Viseu, 2000” diz-se que, no que concerne à area florestal do Ladário, apenas no concelho de Oliveira de Frades, em 1620 hectares estavam arborizados 1560. Com as devastações havidas quanto a incêndios de grandes dimensões, sobretudo em 2006, 2013 e 2017, com mais episódios a registar, aquém e além, hoje o panorama, quanto a florestação é desolador. O Estado tem, nesse campo, imensas culpas no cartório e não é possível que fuja (mas escapa-se, e de que maneira, às suas responsabilidades até mais não...) às tarefas que deveria executar ou ter em mãos vir a fazê-lo e não é isso que está a acontecer, infelizmente. Carlos Rodrigues, NV, Julho 2019