sexta-feira, 19 de julho de 2019

Canta, canta, Lafões...

Lafões a cantar desde sempre Giacometti e José Fernando Oliveira em bons registos Com o Verão, vêm para a rua as energias populares em termos festivos, que se espalham pelos arraiais das diversas romarias, pelos templos e adros, pelas ruas onde passam as muitas procissões, pelos campos quando se sacham os milhos, se regam as propriedades e, lá para o Outono, se fazem as colheitas. Se, nos tempos chuvosos e frios do Inverno, a lareira e os serões são o palco privilegiado para esta manifestações ancestrais da cultura do nosso povo, nestes tempos de sol e longos dias, com as noites a serem um convite para se gozar, em entretenimento, a sua razoável e agradável frescura, é nos largos de nossas aldeias que se soltam todas as alegrias. Para as provar, a música é uma das grandes vias e um dos poderosos meios para mostrar ao mundo tudo aquilo que nos vai na alma. Em Lafões, sempre se cantou, cruzando influências, como em Manhouce, localidade que tem vindo a potenciar, ao máximo, este notável espólio, sobretudo para nos mostrar a passagem dos almocreves e suas paragens, em noitadas animadas, nas eiras daquela terra serrana, dançando-se e cantando-se em conjunto, povos do mar e da serra. Nasceu desta simbiose a pátria da música regional que temos como bom legado e que se espalhou por toda a parte, batendo também, muito em especial, à porta de Cambra (Vouzela), S. Félix (S. Pedro do Sul) e Santa Cruz (Arcozelo das Maias/Oliveira de Frades) Numa vertente diferente, as nossas Bandas Filarmónicas, algumas a passarem por três séculos de existência, desde os anos de 1800 até aos dias de hoje e com muito futuro pela frente, são a outra componente musical e cultural que nos caracteriza, assim como, em medida bem mais reduzida, os Grupos Folclóricos. Em prateleiras diferentes, encontramos ainda as canções religiosas, como as Janeiras, o amentar as almas, etc. Descobrindo as nossas riquezas, por aqui andou, de gravador e câmara em punho, Michel Giacometti (1929 – 1990), o corso, que se enamorou e apaixonou pela música tradicional portuguesa. Assinalando-se, este ano, os noventa anos do seu nascimento e os sessenta da sua chegada a Portugal, o nosso país e a região de Lafões têm para com ele uma dívida de gratidão Vindo para estas terras lusas em busca de cura para a sua tuberculose (1959), desde logo impôs o seu talento, a ponto de, na então Emissora Nacional e na RTP, os seus serviços e arte jamais serem desperdiçados. Entre as várias pessoas que com ele se cruzaram, uma delas, Fernando Lopes Graça, é inquestionável. Com este vulto da nossa música, surgiu a “ Antologia da Música Regional Portuguesa”, depois de Michel Giacometti ter fundado os Arquivos Sonoros. Duas de nossas terras, Manhouce e Cambra, receberam a sua preferência, quer, na RTP, 1972, com o “Povo que canta”, filmado precisamente em Cambra, quer noutros programas e ocasiões. Também Manhouce integrou o seu Cancioneiro Popular Português. A uma escala mais local, mas plena de importância e pertinência, trazemos ainda aqui o “Cancioneiro Regional de Lafões”, com recolha e coordenação de José Fernando Monteiro de Oliveira, 2000, com CD, uma notável e diversificada obra que muito engrandece e prestigia a nossa cultura e bibliotecas. Numa diversificada e muito abrangente pesquisa e registo, as 616 páginas de texto, letras e partituras fazem perdurar no tempo quem somos e o que cantamos, como memória de um rico passado e a ponte cultural segura para nos continuarmos a afirmar no mundo pelos tempos fora. Com os seus “cantares de carácter religioso e profano”, ali temos matéria de sobra para nos conhecermos melhor. E ir desfrutando vezes sem conta. Seria um erro grave e uma omissão imperdoável se, ao falarmos de música em Lafões, nos esquecêssemos de Isabel Silvestre e de tudo quanto ela faz e tem feito em favor da nossa cultura e região. Só o seu nome daria para encher as páginas de muitos jornais. De qualquer modo, esta singela nota apenas quer fazer registar o apreço e consideração que por ela temos. E que merecidas são estas curtíssimas referências. Aí temos o Verão. Vamos à música, a nossa, porque vale sempre a pena e a nossa alma não é pequena. Muito pelo contrário. Carlos Rodrigues, Notícias de Lafões, Jul 2019

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