quinta-feira, 26 de abril de 2018

Pensar Lafões desde sempre e, neste caso, em 1969...

Padre Alberto Poças de Figueiredo e o seu contributo para o património Para se conhecer um pouco da história da Serra de S. Macário e arredores, temos à mão umas folhas policopiadas da autoria do Padre Alberto Poças de Figueiredo, que nos servem de bom guia, sabendo, de acordo com a sua chamada de atenção, que este seu trabalho se debruça, essencialmente, sobre as freguesias de Covas do Rio, S. Martinho das Moitas e Sul, na sua delimitação inicial, bem antes das fusões recentes. Um outra nota tem a ver com o facto de este texto ser o reflexo da Comunicação que fez no I Colóquio Regional de Turismo e Termalismo de Lafões, em Julho de 1969, evento que muito se deveu ao empenho e ao labor do Dr. Carlos Matias, então já com altas funções no sector, e ao trabalho organizativo do Dr. Ricardo Vale de Andrade, numa Comissão presidida pelo Dr. João Casimiro de Almeida Dias. Ligando este Colóquio às comemorações do oitavo centenário de uma das passagens do Rei D. Afonso Henriques por estas nossas terras (1169), meteram-se num só envelope duas mensagens, a do passado e a do presente desta estância termal e seu papel no desenvolvimento local e regional. Num tempo, o de hoje, em que acabou de ser eleito Presidente da Associação das Termas de Portugal o Dr. Víctor Leal, que lidera a Termalistur, tudo se conjuga para que não deixemos passar em claro a figura do Padre Alberto, que nos parece andar um pouco arredado das lides das divulgações do nosso património. No entanto, a sua pesquisa, em muitos casos com alguma especulação, talvez, à mistura, leva-nos à descoberta das magias do passado desta imponente Serra. Em sete páginas, alude-se a vinte e cinco pontos de interesse, devidamente assinalados no texto em causa. À guisa de dicas, eis esses pontos, apenas em indicação sintéctica: Cheia do Castêlo e Lamigueiro, Vale da Erva e Vale da Lança, Fraga dos Mouros, Castro e Santuário, o Cavado, a Pena, Mamoa Grande, Três Mamoas no Espraiado, Castro do Monte Redondo, o Castelo dos Moiros, o Castelo dos Súmios ou Castro do Mau Vizinho, a Fraga Casamenteira, o Rancho de S. Macário, o Nascer do Sol, as Ladainhas, o Alto de S. Macário, Capela de Cima, Capela de Baixo, Romaria de S. Macário, Tentação de S. Macário, o Ermitão, a Cova da Serpe, a Ribeira da Pena, o Portal do Inferno e a Linha das Alturas. Em cada um destes ítens, há umas curtas referências explicativas, facto que pode ser ( e é de certeza) muito útil para um maior aprofundamento e uma investigação mais rigorosa, Em resumo, remata: “ A Serra de S. Macário e suas dependências, fazendo parte do Maciço Montanhoso da Gralheira ou Monte Fuste, é digna do maior interesse para o turismo lafonente do qual constitui um belo cartaz”. Isto foi dito e escrito em 1969, já lá vão quase cinquenta anos. Acontece que esta afirmação não perdeu pitada do seu valor e pertinência. Nem caiu, cremos nós, pelo que temos visto, em saco roto. A propósito desse Colóquio, o vizinho jornal “Notícias de Vouzela”, no citado ano de 1969, bastante se referiu a este acontecimento, realizado nos dias 24, 25, 26 e 27 de Julho, nas Termas, contando com a presença activa dos municípios de Oliveira de Frades, Vouzela e o anfitrião, S. Pedro do Sul. Foi encerrado, então, pelo Secretário de Estado da Informação e do Turismo. Do seu regulamento se extraem alguns aspectos de relevante valor e até actualidade, quase cinquenta anos depois. Aí se afirma que se irão “... 1 - Discutir os problemas relacionados com o turismo e termalismo da região, apresentando as sugestões, recomendações ou medidas que se considerem mais adequadas à sua resolução; 2 – Estimular e articular a colaboração mútua dos três concelhos que compôem a região; 3 – Alertar as entidades públicas e privadas (... ) para as realidades e potencialidades da região neste sector, tendo em vista o seu melhor aproveitamento e valorização; 4 – Consciencializar os interesses locais sobre o valor da actividade turística e do termalismo na promoção económica regional; 5 – Contribuir para um trabalho de inventariação sistemática do património cultural e económico (... ). Paralelamente aos trabalhos que se desenrolaram nas Termas de S. Pedro do Sul, as actividades e iniciativas diversas circularam pelos três municípios, o que mostra o cuidado que houve em envolver todos os participantes. Interessantes e valiosas são as conclusões, falando-se, entre vários outros aspectos, na exigência de uma acção conjunta, na necessidade da intensificação do turismo social, na adopção de medidas tendentes a atrair e a reter os turistas na região, propondo-se até, por o considerarem obsoleto, que se encerrasse o caminho de ferro do Vale do Vouga, para dar lugar à concessão de carreiras de camionagem, “corrigindo o traçado da rodovia fundamental, a EN 16”. Insiste-se na urgência de haver manifestações culturais, artísticas e desportivas com carácter periódico, de se aproveitar a caça, a pesca e o património florestal que “ são factores de atracção e fixação de turistas de valor considerável”, pedindo-se também a criação de adequadas infraestruturas e que haja formação para todos os profissinais que operam nestas áreas. Remata-se com o pedido de construção de uma Pousada no Convento de S. Cristóvão de Lafões. Dito isto há cerca de cinquenta anos, muitas destas ideias bem poderiam, ainda hoje, fazer parte dos planos locais e regionais, quase letra por letra. Nele se integrou ainda a 1ª Exposição de Arte e Artesanato da Região de Lafões, que se localizou em Vouzela. Tendo-se começado este trabalho com a figura do Padre Alberto Poças de Figueiredo, deambulámos por este Colóquio do ano de 1969. E tudo isto porque a dissertação sobre o património da Serra de S. Macário ali foi apresentada e com toda a propriedade, assim como muitas outras intervenções, permitindo-se-nos que aqui digamos que um nosso Tio, Aires Alves Lopes, da Casa de Lafões, em Lisboa, teve ali uma exposição de fundo sobre toda a nossa Região, vista à luz de quem, um dia, a deixou para se fixar e radicar na capital, onde desenvolveu uma relevante acção social sobretudo na Casa que acabámos de citar, em diferentes papéis e funções, mas sobretudo como seu dinâmico e activo Presidente. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, 26 Abril 2018

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Enzimas devoradoras de plástico: a ciência a avançar

De dia para dia, a ciência premeia-nos com mais descobertas. Agora, tendo em conta a praga e a chaga dos plásticos abandonados, que demoram centenas de anos até virem a ser desfeitos, trazem-nos uma nova enzima que faz o milagre de os devorar em pouco tempo. Maravilha! Mas, no fundo do fundo, fica-nos sempre o mundo da dúvida: como será que, daqui a uns tempos, se eliminam as enzimas engordadas com essa carga indigesta de todo? Entretanto, avance-se antes que o chão e os mares se tornem presas desses factores de poluição dos mais aborrecidos e teimosos que andam por aí. Depois, logo se verá o que vai acontecer às enzimas agora muito nossas amigas... Logo se verá...

terça-feira, 17 de abril de 2018

Aos nossos Pais, sempre...

Pais a pensarem o futuro desde o passado Ano após ano, há datas repetíveis que devem ser sempre refrescadas e refrescantes. Temos de lhes tirar o mofo e dar-lhes cheiros e cores agradáveis, atraentes, modernas, mas sem perderem o toque de tradição que em si contêm e não podem perder. Falar do Dia do Pai, em cada ano, é este exercício de memória, gratidão, de vazio, em muitos casos, de um exemplo a seguir em cada momento de nossas vidas. É este olhar para o passado e logo pensarmos no futuro. Ou chorar lágrimas pesadas, porque já cá não está quem tanto amamos, sempre. Na presença, ou na ausência. Um Pai é alguém especialíssimo, insubstituível, que só o é porque também existe uma Mãe, a quem tudo devemos, até o sacrfício de ter andado connosco cerca de nove meses na sua quente e aconhegante barriga, um sítio onde, talvez, apetecesse ficar tempos sem fim. Porque não há melhor lugar que o ventre materno para cada um de nós. Só sabemos falar dos Pais se a eles associarmos as nossas Mães. Essa é a melhor das duplas que conhecemos, a completarem-se um à outra. Nesta data de 19 de Março, Dia do Pai, para além das considerações anteriores, importa que digamos mais umas curtas palavras. Desde o acto de se pensar em ter um(a) filho(a) até ao momento de vermos nascer quem tanto desejamos, logo se notam preocupações, ora de uma natureza, ora de outra. Quem vem lá? Como serei eu capaz de ser bom Pai? Que futuro lhe está reservado? Perante um infinito leque de interrogações, sempre o coração de um Pai bate forte, fortemente. É enorme a responsabilidade que, desde a decisão até à sua concretização, pesa sobre os nossos ombros. Com a sociedade a não ser muito colaborante, em muitas situações, estamos frequentemente face a um velho ditado em que se fala em “filhos criados, cuidados redobrados”. E assim é, na actualidade, como deve ter sido no tempo dos Pais dos nossos Pais, a ponto de nos legarem este provérbio como parte do nosso património e da nossa identidade. Em pequeninos, queremos dar-lhe todo o conforto e qualidade de vida, munindo os nossos filhos com as ferramentas que, eles e nós, Pais, pensamos ser as melhores para enfrentarem a vida. Por uma série de azares, nem sempre esses nossos cuidados vêm a dar certo. Começam os problemas: sem emprego, sem grandes perspectivas de vida, os filhos entram em pânico e nós, Pais, em dor aguda por lhes não podermos ser úteis, como queríamos e eles merecem. Entra-se num velho dilema: o passado não foi o suporte para um futuro seguro. Perguntamos: quem falhou, os Pais, ou a sociedade, ou todos ao mesmo tempo? Sem respostas, passamos a viver em ansiedade permanente, em angústias dilacerantes. Ainda que assim seja, não há nada melhor que ser-se Pai, ou Mãe, ou Pai e Mãe. Essa é a maior prenda que um Pai pode receber. Muito melhor que qualquer objecto que para aí ande nestes tempos em que tudo se comercializa. Mas ser-se Pai não tem preço. Nenhum. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, Março, 2018

EN 16 com fissuras preocupantes entre as Termas de S. Pedro do Sul e Vouzela

EN 16 com ameaças de ruir Entre as Termas de S. Pedro do Sul e Vouzela há perigo iminente A estrada que liga estes dois pólos importantes de Lafões, as Termas de S. Pedro do Sul e Vouzela, a conhecida e velhinha EN 16, desde há muitos anos que carece de obras de fundo e urgentes. O seu piso e as curvas acentuadas que fazem parte deste troço reclamam uma acção a sério, uma sua total requalificação, ou mesmo o arrojo de se avançar para uma via de quatro pistas. Aliás, em tempos, se a memória nos não falha, chegaram a estar alocados 500 mil euros para esta finalidade, mas o certo é que nunca aqui chegou essa verba, com evidente prejuízo para a circulação de viaturas e até das muitas pessoas que fazem este percurso de poucos quilómetros a pé. Reforce-se a ideia que, entre a cidade de S. Pedro do Sul e o A25, esta parte da citada EN 16 tem muito trânsito, por ser a ligação principal de acesso àquele autoestrada, incluindo para quem vem da direcção de Lamego/Castro Daire. Esta constatação mais reforça a necessidade dos trabalhos que atrás evocámos. De momento, tudo se agrava, na medida em que, à entrada desta vila, por cima do acesso à Quinta da Sernada, houve um recente abatimento do piso e o muro de suporte, bem alto, por sinal, apresenta graves fissuras, o que não pressagia nada de bom. Tratando-se de um espaço em curva, sobretudo para quem o sobe, apesar da sinalização ali colocada e da delimitação do local afectado por este abatimento, a cada movimento de veículos, com uma só via de circulação, toda a gente treme. E não é para menos. Num certo domingo, há pouco tempo, tivemos o cuidado de ali parar uns minutos, por volta do meio-dia, tendo verificado inúmeras situações de aperto, entretanto, resolvidas com alguma perícia e uma certa dose de precipitação que nunca é boa conselheira. Contactado o Presidente da Câmara de Vouzela, Rui Ladeira, acerca deste assunto, remeteu-nos – e bem – para o dono desta via, neste local, as Infraestruturas de Portugal. Desta entidade, apesar de vários contactos estabelecidos com a finalidade de ficarmos a saber o que ali se pretende fazer, não recebemos até este momento qualquer resposta, ficando, porém, na expectativa de virmos a ser informados se assim for entendido. Para já, fica o relato daquilo que nossos olhos viram e um pedido de atenção para os cuidados a ter naquele troço em perigo. Carlos Rodrigues, in “ Notícias de Vouzela”, 12 abr2018

sexta-feira, 13 de abril de 2018

Vida humana em Lafões desde há milénios

Viver em Lafões é decisão com milénios de história Ainda estas terras não eram conhecidas como Lafões e já por aqui se localizavam diversos povos, uns vindos não se sabe bem de onde, outros nascidos de gerações anteriores, que foram ganhando raízes e não mais daqui saíram. Portanto, quem nos antecedeu inscreveu seu nome na longa listagem dos habitantes destes territórios situados entre o Caramulo e a Gralheira, tendo o Rio Vouga como ponto de encontro e linha divisória ao mesmo tempo. Somos, nós, filhos de toda essa gente, a quem temos de estar eternamente gratos. Com um certo direito duplo, ligado ao solo e ao sangue, desses dois canais se fez o povoamento destas paragens, desde há milénios. Sem sermos capazes de, por agora, determinar o sentido da ocupação destes espaços, talvez não faltemos à verdade se disssermos que a maioria dos primeiros povoadores deve ter surgido do litoral para o interior, se pensarmos em certas invasões marítimas como as dos fenícios, por exemplo, mas, por outro lado, se olharmos para diversos movimentos no interior da Europa, também não será descabido buscar as suas origens em fugas em massa a climas adversos ou mesmo guerras entre grupos que foram empurrando, sucessivamente, os perdedores para fora de suas “fronteiras”. À cautela, apontemos estas duas hipóteses para não corrermos o risco de falharmos redondamente. A tese do mar faz algum sentido na medida em que o Rio Vouga chegou a ser navegável até cerca de S. Pedro do Sul em tempos muito recuados. Por sua vez, o Douro era, de certeza, uma outra fonte de penetração nas nossas paragens, estas captadas das populações que se metiam pela sua margem sul adentro, descendo, depois, na vertical até aos locais que então considerassem oferecer melhores condições de subsistência e vivência, atravessando a zona de Arouca e locais por perto. Do sul para norte, vinham, reconhecidamente, os povos árabes na sua caminhada vitoriosa nos séculos VIII e seguintes. No que diz respeito à vinda pelo mar, Teresa Ferreira Rodrigues e outros atestam na sua “História da população portuguesa – Das longas permanências à conquista da modernidade, CEPESE, Edições Afrontamento, 2009” que Baiões e o seu Castro da Senhora da Guia devem ter assumido um papel relevante nos contactos estabelecidos com os citados fenícios. Provando-o, escrevem que “... Do expressivo conjunto final da Idade do Bronze, que constitui o depósito fundidor encontrado em 1983,(existe) um punhal com cabo de bronze e lâmina de ferro (...) uma peça isolada, certamente de importação, aparecida no interior de um conjunto fundamentalmente composto por bronzes atlânticos (... )relacionáveis com contactos estabelecidos pelos povos fenícios a quem se pode atribuir a introdução da metalurgia do ferro na Península Ibérica... “ (p. 38). É assim este um testemunho de um dos primeiros povoamentos fixos, em Lafões, com uma boa imagem a grande repercussão para a época. Referindo-se a este mesmo local e a esses tempos, Jorge Adolfo Marques (Carta Gastronómica de Lafões, 2016), fala no aparecimento de sementes de trigo, cevada e aveia e de leguminosas, tais como fava e ervilha, o que atesta a permanência de povos por aqui e sua fixação com cultivo e amanho das terras, ou trazendo de outros lados esses cereais e outras espécies. O mais provável, porém, é já a sua ligação a actividades agrícolas para a sua subsistência. João Silva de Sousa, na mesma obra, diz-nos que os os celtiberos e os “cempsi” marcaram estas e outras terras com seu rasto definidor, porque “.... Deixaram ainda os primeiros castros ou fortificações muito rudimentares, de forma redonda ou quadrangular, feitos de pedra e terra húmida. Não viviam normalmente no seu interior, mas, no caso de ataque, neles resguardavam as suas gentes e haveres e daí iniciariam a defensiva” (p. 42). Aqui temos uma espécie de leitura nova das funções desses pontos estratégicos, que não seriam então o cerne dos aglomerados populacionais, mas sim formas expeditas de fuga aos ataques dos invasores, que, desta forma, os não encontravam desprevenidos. Pressupunham, por isso, que nas imediações, talvez em lugares mais planos e mais produtivos, se abrigavam os povos que se serviam daquelas construções para seu refúgio sempre que tal fosse necessário. Carvalhais, Campia, Souto de Lafões e tantas outras destas construções mostram-nos isso mesmo. Olhando para cada um deles e seus arredores, facilmente descobrimos, por perto, em cotas mais baixas os tais locais habitáveis em tempos de paz ou de menores inquietações. Do megalitismo, a arte das pedras grandes, para simplificar o conceito, é rica a nossa região de Lafões, devido à existência de imortais exemplares de antas ou, no mínimo, de mamoas, que se espalham por toda a parte, com mais ou menos intensidade, mais ou menos valor histórico, mas todas elas importantes. Conhecem-se também como dólmens. No concelho de Vouzela, temos, por exemplo, a Lapa da Meruje (Carvalhal de Vermilhas), o Vale de Anta (Fornelo do Monte), a Malhada de Cambarinho (Ventosa); em Oliveira de Frades – Antelas (Pinheiro de Lafões), Paranho de Arca (Arca), Vessada do Salgueiro (Arcozelo das Maias); em S. Pedro do Sul – Anta (Manhouce). A par destas citações expressas, muitas outras existem aquém e além, umas descobertas e conhecidas, outras ainda à espera de ser postas à luz do dia como acontece em Pereiras – Alto da Cumeeira (Pinheiro de Lafões) e na Serra de S. Macário (S. Pedro do Sul). Terminamos, por hoje, com o testemunho de A. H. de Oliveira Marques ( História de Portugal, Palas Editores, Lisboa, volume I, 1980) que assim nos mostra o povoamento das terras que hoje são Portugal e Espanha: “ O homem chegou à Península Ibérica bem cedo na história “ (p. 10), sendo que todas as culturas, acrescenta, se espalharam pela totalidade destes espaços. Sabendo que muito provavelmente temos aqui, neste capítulo, referências já anteriormente feitas, a nossa intenção, desta vez, insere-se num trabalho mais vasto e de maior fôlego, que passa pela esquematização de contributos para uma História de Lafões, o que a isso nos leva. Não querendo, no entanto, ser aborrecidos e repetitivos, mais vale pecar por escesso do que por escassez de informação. É esse o nosso lema. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, 12 de Abril de 2018

Recordar e homenagear quem de Lafões andou na 1ª Grande Guerra

Cem anos depois da batalha de La Lys A nossa sentida e merecida homenagem O dia 9 de Abril de 1918, no contexto da 1ª Grande Guerra, tornou-se uma das datas mais traumáticas na história nacional portuguesa. Em terras de França, as nossas tropas foram dizimadas pelas forças alemãs, numa proporção de efectivos e meios que pôs a nu as nossas debilidades a todos os níveis: menos homens, menos formação, menos equipamentos, menos programação fizeram toda a diferença. Salvou-se uma outra e inesquecível dimensão – a dignidade com que as nossas gentes se bateram lá longe, em trincheiras por eles cavadas, no meio de nada. Entre cerca de 7500 baixas, de 9 a 12 de Abril, mortos uns, feridos muitos outros, aprisionadas grande parte dos restantes, de todos eles só nos restam as memórias. Num grande trabalho de pesquisa, datado de 2016, o nosso conterrâneo de S. Pedro do Sul (SPS), António Ferreira Gomes, deixou-nos um valioso testemunho sobre quem por ali andou e ali deixou tudo, incluindo, em muitos casos, a própria vida, com a sua obra “ A Grande Guerra, 1914-1918, O legado de SPS, Editora Exclamação, Porto”. Evocando seu avô, José Ferreira, um desses combatentes, prestou-lhe pública homenagem com o estudo que acabámos de citar. Por alturas do 1º Centenário dessa catástrofe, talvez só comparável a Alcácer-Quibir, como acentuou, nestes últimos dias, o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa, pegámos neste livro e folheámo-lo uma vez mais, com emoção e gratidão. Dele partimos para estes apontamentos. Num conflito que, como ali se escreve, mobilizou cerca de 65 milhões de homens por todo o mundo, tendo deixado nos campos de batalha 8 a 9 milhões de mortos militares a que se juntam 6 milhões de civis, tendo havido ainda 21 milhões de feridos, em 106000 portugueses presentes nesta Guerra, 214 eram do concelho de S. Pedro do Sul. No devastador teatro das operações, que decorreram entre 28 de Julho de 1914 e 11 de Novembro de 1918, a batalha de La Lys, em território francês, tem para o nosso país um desastroso simbolismo. Nas 7500 baixas verificadas, contam-se, nesse dia 9 de Abril de 1918, do concelho de S. Pedro do Sul, 7 mortos directamente afectados pelos terríveis confrontos desse dia fatídico, fora outros que se foram perdendo ao longo dos tempos como consequência desse trágico acontecimento. Portugal partiu para esta Guerra metido entre emoções e posições altamente contraditórias, com opiniões francamente contra e outras a favor, unindo-as apenas um ponto: a necessidade de se honrarem as alianças com a Inglaterra, fortemente envolvida nesta contenda, estando do outro lado a Alemanha, que acabaria por vir a perder em toda a linha. Dizem as crónicas que, aquando das mobilizações de 1917, para as diversas frentes de combate partiram “telegrafistas sem saber ler e escrever, artilheiros desconhecedores do material” e muitos sem qualquer instrução de tiro. Por sua vez, Henrique Manuel Gomes da Cruz (2014), em “ Portugal na Grande Guerra: a construção do «mito» de La Lys na imprensa escrita entre 1918 e 1940, FCSH/UN de Lisboa” integra este contexto de deficiente preparação no facto de, em 1911, haver 4478078 habitantes iletrados, cerca de 75.1% da nossa população, num país rural, fracamente industrializado, sem hábitos de higiene e saúde, factos que levaram a que, nos contingentes diversos, tivessem seguido muitos militares já francamente doentes e enfraquecidos. Se, em Angola e Moçambique, logo desde o início se perderam imensas vidas, em La Lys foi o que se sabe. Culpados? Como afirmar isso? Nem a história ainda conseguiu responder a este enorme problema, apesar das muitas conjecturas que têm sido feitas ao longo destes cem anos. Quanto à região de Lafões, sabe-se que muitos foram os nossos conterrâneos dos concelhos de Oliveira de Frades, Vouzela e, como aqui se vê, de S. Pedro do Sul que deram o seu melhor pelas cores portuguesas, mormente a partir do 1º Batalhão de Infantaria do RI 14 (Viseu) que integrou nas suas hostes 27 oficiais, 58 sargentos e 1149 cabos e praças, tendo saído de Lisboa a 23 de Março de 1917. Depois do início da batalha de La Lys, às 4 horas e 10 minutos do dia 9 de Abril de 1918, muita dessa gente não mais regressou. Muitos desses militares talvez repousem eternamente no Cemitério de Richebourg. A nossa sentida homenagem aos nossos Heróis. Recordar estes e todos aqueles que lutaram pela Pátria em qualquer tempo e em qualquer lugar ( é importante que isto assim se diga) é um dever e um sinal de gratidão que jamais podemos esquecer. Bem o fizeram o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, o PM António Costa e o Presidente francês Emmanuel Macron. Cem anos depois, aqui fica também esta nossa humilde evocação. Carlos Rodrigues, in “ Notícias de Lafões”, 12 de Abril de 2018 NOTA – Depois de enviado este trabalho, anexamos agora mais uns dados sobre os militares de Lafões que participaram nesse conflito, alguns deles tendo como destino a passagem por campos de concentração e trabalhos forçados, outros com destinos diversos que a triste vida lhes reservou. Felizmente que, no meio de tanta desgraça, ainda houve quem tivesse conseguido sobreviver praticamente até aos nossos dias. No nosso caso pessoal, tivemos o prazer de contactar ainda com Abílio Nunes Gonçalves, da Sobreira – Reigoso, corneteiro, do RI 14, e que foi regedor naquela freguesia durante muitos anos. Quanto aos que foram apanhados nas malhas do exército inimigo, como prisioneiros, temos boa informação em “ Maria José Oliveira – Prisioneiros portugueses da primeira Guerra Mundial, Frente Europeia, 1917/1918, Edições Saída de Emergência, Porto Salvo, 2017”, fonte de que nos servimos para estas notas. Assim nos fala: “... Entre 1917 e 1918, mais de 7000 militares do CEP estiveram presos em 81 campos de internamento e trabalhos forçados. Nos dois teatros de guerra, em África e na Europa, contaram-se 13645 presos e desaparecidos” (p.15). Sabe-se ainda que o 1º contingente do citado CEP embarcou em Alcântara para Brest (França) em 26 de Janeiro de 2017. Numa lista de 111 prisioneiros mortos, Maria José Oliveira cita expressamente, quanto à nossa região de Lafões, os nomes de Adelino Almeida – Fataunços, Adelino Tavares Ribeiro da Costa – Arcozelo das Maias, António Lourenço Alves – Paços de Vilharigues, Artur Francisco Grilo – S. Pedro do Sul e Diamantino de Oliveira – Oliveira de Frades. Entretanto, por meio de outras fontes, sobretudo ligadas ao Arquivo Histórico Militar, podemos ficar a saber, ainda que com eventuais falhas, quem combateu neste enorme conflito mundial. Eis algumas referências, em oficiais – Concelho de Oliveira de Frades: Zeferino Martins da Silva Borges, Luís de Portugal da Fonseca e Melo, Manuel Lopes Ferreira; S. Pedro do Sul – Manuel de Vasconcelos, Manuel Correia de Figueiredo, Manuel de Almeida Oliveira e António Marques da Costa; Vouzela – Francisco Correia de Figueiredo, Francisco Fernandes Aidos, José Martins Lopes Ribeiro, Abel Figueiral, Paulo Emílo Alberto de Figueiredo Garcia, João da Silva (Genealogia FB). Entre muitas outras centenas de sargentos e praças, citemos ainda os nomes de Abílio Nunes Gonçalves, António Lopes Ferreira, António Oliveira Fontes, Joaquim Dias Pereira Ramos e Manuel Fernandes da Costa (Id). Em localidades, apenas tendo em conta o município de Oliveira de Frades, há referências explícitas a Nespereira, Sobreira, Vila Chã, Santiaguinho, Porcelhe, Casal Bom, Destriz, Cajadães, S. Vicente, Prova, Oliveira de Frades, Quintela, Covelo, Entráguas, Vilarinho, Cadavais, Areal, Ribeiradio, Várzea, Parada, Arcozelo das Maias, Souto Maior, Pinheiro de Lafões, Bezerreira, Travassós, Várzea, Paranho, Destriz, Sequeirô, Souto de Lafões, Candemil, Conlela, Ponte, etc. Em suma, em cada uma de nossas terras, talvez possamos dizer que alguém daí natural ou residente passou por tão duras agruras. No momento em que se comemoram cem anos do fim dessa mortífera 1ª Grande Guerra, curvemo-nos perante sua memória, em homenagem e gratidão .