sexta-feira, 13 de abril de 2018

Vida humana em Lafões desde há milénios

Viver em Lafões é decisão com milénios de história Ainda estas terras não eram conhecidas como Lafões e já por aqui se localizavam diversos povos, uns vindos não se sabe bem de onde, outros nascidos de gerações anteriores, que foram ganhando raízes e não mais daqui saíram. Portanto, quem nos antecedeu inscreveu seu nome na longa listagem dos habitantes destes territórios situados entre o Caramulo e a Gralheira, tendo o Rio Vouga como ponto de encontro e linha divisória ao mesmo tempo. Somos, nós, filhos de toda essa gente, a quem temos de estar eternamente gratos. Com um certo direito duplo, ligado ao solo e ao sangue, desses dois canais se fez o povoamento destas paragens, desde há milénios. Sem sermos capazes de, por agora, determinar o sentido da ocupação destes espaços, talvez não faltemos à verdade se disssermos que a maioria dos primeiros povoadores deve ter surgido do litoral para o interior, se pensarmos em certas invasões marítimas como as dos fenícios, por exemplo, mas, por outro lado, se olharmos para diversos movimentos no interior da Europa, também não será descabido buscar as suas origens em fugas em massa a climas adversos ou mesmo guerras entre grupos que foram empurrando, sucessivamente, os perdedores para fora de suas “fronteiras”. À cautela, apontemos estas duas hipóteses para não corrermos o risco de falharmos redondamente. A tese do mar faz algum sentido na medida em que o Rio Vouga chegou a ser navegável até cerca de S. Pedro do Sul em tempos muito recuados. Por sua vez, o Douro era, de certeza, uma outra fonte de penetração nas nossas paragens, estas captadas das populações que se metiam pela sua margem sul adentro, descendo, depois, na vertical até aos locais que então considerassem oferecer melhores condições de subsistência e vivência, atravessando a zona de Arouca e locais por perto. Do sul para norte, vinham, reconhecidamente, os povos árabes na sua caminhada vitoriosa nos séculos VIII e seguintes. No que diz respeito à vinda pelo mar, Teresa Ferreira Rodrigues e outros atestam na sua “História da população portuguesa – Das longas permanências à conquista da modernidade, CEPESE, Edições Afrontamento, 2009” que Baiões e o seu Castro da Senhora da Guia devem ter assumido um papel relevante nos contactos estabelecidos com os citados fenícios. Provando-o, escrevem que “... Do expressivo conjunto final da Idade do Bronze, que constitui o depósito fundidor encontrado em 1983,(existe) um punhal com cabo de bronze e lâmina de ferro (...) uma peça isolada, certamente de importação, aparecida no interior de um conjunto fundamentalmente composto por bronzes atlânticos (... )relacionáveis com contactos estabelecidos pelos povos fenícios a quem se pode atribuir a introdução da metalurgia do ferro na Península Ibérica... “ (p. 38). É assim este um testemunho de um dos primeiros povoamentos fixos, em Lafões, com uma boa imagem a grande repercussão para a época. Referindo-se a este mesmo local e a esses tempos, Jorge Adolfo Marques (Carta Gastronómica de Lafões, 2016), fala no aparecimento de sementes de trigo, cevada e aveia e de leguminosas, tais como fava e ervilha, o que atesta a permanência de povos por aqui e sua fixação com cultivo e amanho das terras, ou trazendo de outros lados esses cereais e outras espécies. O mais provável, porém, é já a sua ligação a actividades agrícolas para a sua subsistência. João Silva de Sousa, na mesma obra, diz-nos que os os celtiberos e os “cempsi” marcaram estas e outras terras com seu rasto definidor, porque “.... Deixaram ainda os primeiros castros ou fortificações muito rudimentares, de forma redonda ou quadrangular, feitos de pedra e terra húmida. Não viviam normalmente no seu interior, mas, no caso de ataque, neles resguardavam as suas gentes e haveres e daí iniciariam a defensiva” (p. 42). Aqui temos uma espécie de leitura nova das funções desses pontos estratégicos, que não seriam então o cerne dos aglomerados populacionais, mas sim formas expeditas de fuga aos ataques dos invasores, que, desta forma, os não encontravam desprevenidos. Pressupunham, por isso, que nas imediações, talvez em lugares mais planos e mais produtivos, se abrigavam os povos que se serviam daquelas construções para seu refúgio sempre que tal fosse necessário. Carvalhais, Campia, Souto de Lafões e tantas outras destas construções mostram-nos isso mesmo. Olhando para cada um deles e seus arredores, facilmente descobrimos, por perto, em cotas mais baixas os tais locais habitáveis em tempos de paz ou de menores inquietações. Do megalitismo, a arte das pedras grandes, para simplificar o conceito, é rica a nossa região de Lafões, devido à existência de imortais exemplares de antas ou, no mínimo, de mamoas, que se espalham por toda a parte, com mais ou menos intensidade, mais ou menos valor histórico, mas todas elas importantes. Conhecem-se também como dólmens. No concelho de Vouzela, temos, por exemplo, a Lapa da Meruje (Carvalhal de Vermilhas), o Vale de Anta (Fornelo do Monte), a Malhada de Cambarinho (Ventosa); em Oliveira de Frades – Antelas (Pinheiro de Lafões), Paranho de Arca (Arca), Vessada do Salgueiro (Arcozelo das Maias); em S. Pedro do Sul – Anta (Manhouce). A par destas citações expressas, muitas outras existem aquém e além, umas descobertas e conhecidas, outras ainda à espera de ser postas à luz do dia como acontece em Pereiras – Alto da Cumeeira (Pinheiro de Lafões) e na Serra de S. Macário (S. Pedro do Sul). Terminamos, por hoje, com o testemunho de A. H. de Oliveira Marques ( História de Portugal, Palas Editores, Lisboa, volume I, 1980) que assim nos mostra o povoamento das terras que hoje são Portugal e Espanha: “ O homem chegou à Península Ibérica bem cedo na história “ (p. 10), sendo que todas as culturas, acrescenta, se espalharam pela totalidade destes espaços. Sabendo que muito provavelmente temos aqui, neste capítulo, referências já anteriormente feitas, a nossa intenção, desta vez, insere-se num trabalho mais vasto e de maior fôlego, que passa pela esquematização de contributos para uma História de Lafões, o que a isso nos leva. Não querendo, no entanto, ser aborrecidos e repetitivos, mais vale pecar por escesso do que por escassez de informação. É esse o nosso lema. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, 12 de Abril de 2018

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