sábado, 29 de agosto de 2020

Pensar Portugal à moda de Tolentino de Mendonça...

Precisamos de viajar juntos Até parece mentira e ficção o titulo deste texto. Isto de dizermos que precisamos de viajar juntos, quando todas as normas da Organização Mundial de Saúde e da nossa Direcção Geral da mesma área nos andam todos os dias a pedir que nos afastemos uns dos outros, cheira quase a heresia, a uma contra ordem. No entanto, não se trata de nada disso. Tem só e tudo a ver com o muito que o Cardeal Tolentino de Mendonça nos disse no passado Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades, num Mosteiro dos Jerónimos parecido com a Praça de S. Pedro em Roma, por alturas da Páscoa, por estar praticamente vazio. Anotemos essa, mais uma, das suas mágicas e cativantes frases. Que nos desculpe o Presidente Marcelo, mas, ali e naquele nosso dia, quem verdadeiramente nos mobilizou foi mesmo o Cardeal Tolentino. Num discurso marcante, todo ele voltado para a necessidade de nunca deixarmos de lado, nem esquecermos as nossas raízes, cada uma de suas linhas foi os Lusíadas por inteiro. A comunidade que invocou, a urgência em avançarmos para a realização do sonho de sermos concidadãos, de cuidarmos das múltiplas partes para, juntos, edificarmos o todo, de colocação das pessoas no centro, de fortalecer o pacto integeracional, passou toda por aqueles seus minutos de conversa de fino recorte e acutilância bem medida. Olhando para um desconfinamento que deve fazer de cada um de nós um actor participante, mais do que de números, mais do que de finanças e de economia puras, falou-nos em fincarmos as raízes no chão, em partirmos para os tempos duros que aí vêm num modo novo: o de um amplo projecto, que a todos diz respeito. Se cada geração – e estamos sempre a pegar nas suas ideias – e cada tempo têm momentos bons e maus, sucessos e vulnerabilidades e até tempestades, só com compaixão e fraternidade conseguiremos vencer os problemas e os medos que invadem cada um de nossos dias. “ Precisamos de viajar juntos”, de reabilitar o pacto comunitário, de implementar um novo pacto ambiental, de, repetimos, fortalecer um outro pacto, o intergeracional. Não podemos cortar a sociedade às rodelas, velhos para um lado, novos para outro, nem é possível que continuemos a matar as esperanças dos mais jovens/adultos. Nesta roda, temos de caber todos, à uma e todos com todos. Estando tudo conectado, isto é, ligado por todos os lados e de alto até abaixo, só uma visão inclusiva será o motor da mudança que tem de acontecer. Chorando as perdas, com uma crise que é poliédrica, ou seja, tem muitas dimensões e faces, além da doença, da Covid 19, temos de vencer o desemprego, a diminuição das condições de vida, o empobrecimento radical, a fome, numa hora que tem de ser de solidariedade. Total. Ao sermos instados a cuidar da vida, de todas as vidas, sem excepção, que nunca esqueçamos esta sábia lição do Cardeal Tolentino de Mendonça, um madeirense que não teve as comemorações do 10 de Junho de 2020 na sua terra natal, a Madeira, precisamente porque a pandemia nos trocou as voltas, todas as voltas da vida. Discursou para uma dezena de pessoas de cara tapada, mas chegou-nos, a todos nós, ao fundo do coração e mexeu-nos com a cabeça. Quase que somos levados a propôr: que cada decisor político, incluindo o Eng. António Costa e Silva, que tem o projecto da nossa recuperação em mãos, tenha nas suas mesas de cabeceira este “sermão” de 10 de Junho. Que, entre números, se saiba que isto só vai com o empenho de cada um de nós e de todos nós bem juntos. Para não nos desviarmos um segundo destas ideias do Cardeal Tolentino, nem uma palavra aqui colocamos a mais, nem uma qualquer referência aos tempos conturbados que estamos a presenciar e a viver, numa doença de outra dimensão.Até porque tudo se vence se virmos em cada pessoa, em todas elas, a parte da sociedade que temos de reconstruir, que o sonho só se consegue em dura experiência e em conjunto... Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, Ago 2020, em virtude do atraso por causa da pandemia...

quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Vouzela e Lafões há 50 anos...

O Notícias de Vouzela de há 50 anos Preocupações e questões para resolver Percorrendo os arquivos deste jornal “Notícias de Vouzela”, fazemos hoje uma viagem até ao ano de 1970, começando-se logo por referir que era de regozijo o tempo vivido pelo facto de, nessa altura, este órgão de comunicação social ter passado a trimensário, depois de ter sido publicado de 15 em 15 dias desde o seu nascimento em 1935. Logo a seguir, começavam as preocupações e uma delas relacionava-se com as questões da saúde e de uma forte onda gripal que se vivia nesta região. Neste sentido, falava-se num Inverno rigoroso e numa gripe intensa, a ponto de se referir que ela atinge “numerosos lares, alguns dos quais tiveram já na cama todos os seus componentes”. Sendo geral, numa propagação absolutamente anormal, algumas das freguesias de Lafões eram das mais flageladas. Sem que haja uma ligação directa e oxalá que isso não aconteça, não deixa de ser relevante, quando olhamos para a nossa actualidade, esta constatação - a de se estar perante um preocupante surto gripal, que, como se sabe, tem muito de cíclico e nos visita praticamente todos os anos, ora de uma forma mais leve, ora muito mais intensa e preocupante. Volvidas cinco décadas, num tempo em que a Covid já muito nos preocupa e assusta, se essa gripe aparecer assim em força estaremos então perante uma situação que traz indesejadas complicações de maior, a juntarem-se à pandemia que nos assola e, pelo que se sabe, não desaparecerá tão cedo quanto se deseja e espera. Fazemos votos para que a história, neste caso, se não repita. Nessa época de 1970, estava também em cima da mesa o problema da EN 333, aquela que liga Vagos a Vouzela ( de que fizemos, pessoalmente, há uns tempos, um razoável estudo que levou a várias exposições nos concelhos por onde ela passa), protestando-se contra a sua não conclusão, havendo muitos troços por fazer e outros a melhorar. A par de muitas outras reivindicações, desde a electrificação aos telefones, passando pelas mais diversas áreas, as vias de comunicação estavam num dos lugares cimeiros dos problemas em discussão. Ainda na área das vias de comunicação, a povoação de Varzielas mostrava o seu descontentamento porque a carreira Queirã – Viseu e Caramulo – Águeda não era obrigada a manter a ligação à aldeia em causa e isso muito afectava os passageiros dessa terra. “ o que é triste e desolador”. Porém, alguns dias após este desabafo, a empresa Oliveiras – Transporte e Turismo, SARL, vem indicar que, no horário do meio dia, essa pretensão será atendida. Do mal o menos. Uma outra esfera de assuntos relacionava-se com as madeiras e gritava-se contra a Madeiper, que, num insulto à pobreza, assim se escrevia, acabara de “ decretar ditatorialmente o (seu) preço”. Como, muitas vezes, há aspectos colaterais a surgirem, saudava-se a ideia e o apelo “ a todos os lavradores que se sentem (...) se deverem juntar para se poderem defender em cooperativas”, quando por aqui eram, nessa altura, bons os exemplos nos campos da agricultura e da vinicultura, com sedes, respectivamente, em Vouzela e S. Pedro do Sul. Entretanto nem tudo eram queixas, na medida em que vinha estampada uma boa iniciativa, a criação do Movimento de Promoção Social do concelho, concretizado na Associação Pró – Oliveira de Frades. Propunha-se trabalhar em diversos domínios, tendo-se, de imediato, avançado para uma Comissão de Saúde e para o debate dos temas que preocupam os agricultores. Se este ano tudo pudesse correr normalmente e não existissem as restrições e cuidados a ter com a Covid 19, estaria o concelho de Vouzela em onda de grande animação com as suas Festas do Castelo. Tal como já aconteceu em Oliveira de Frades e S. Pedro do Sul, onde foram cancelados esses mesmos eventos, e como sucede em cada uma de nossas povoações e na Pedra da Broa sem a sua tradicional sardinhada, resta-nos abordar o que se dizia quanto à edição vouzelense de 1970, ao saudar-se o regesso da Banda de Palmela e o festival luso-espanhol de folclore, estando acordada a vinda dos Ranchos de Orense e Léon, da Galiza, o da Região do Vouga e o de Torredeita, além das noites na Capucha. Ao lado, registava-se que era significativo o número de veraneantes em Oliveira de Frades, a ponto de o Correspondente assinalar que “.... Torna-se impossivel indicar totalmente todos quantos por aqui se encontram e de que nos abstemos para evitar melindres... “ Nesses tempos, o turismo estava em alta. Hoje, pelas razões que todos conhecemos, este sector vive momentos de verdadeiro sufoco com a paragem abrupta e quase total desta importante actividade económica. Felizmente que, por aqui, ao que sabemos, a recuperação começa a verificar-se e ainda bem. Esperando-se melhores dias, que se recomece a “passar bem”, porque de tristezas temo-las tido em grande quantidade e dor... Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, Agosto 2020

sábado, 1 de agosto de 2020

A nova Europa que se deseja...

Integramos uma Comunidade que é filha de horrores - Pestes e guerras a marcarem todos os tempos Desde o ano de 1986, Portugal faz parte da então Comunidade Económica Europeia, hoje UE. Essa foi a resposta encontrada para fazer face à saída do Império e aos desafios que, como portugueses, tínhamos pela frente. Fechadas as portas das terras viradas para o mar, que foram o nosso desígnio de cerca de cinco séculos, aquela foi a hora de nos virarmos para a Europa, nossa terra-mãe, que se unira em redor da defesa de um projecto comum. Por triste coincidência, a necessidade desse reencontro de irmãos desavindos, como foram os povos europeus, sobretudo em duas terríveis e mortíferas guerras mundiais, nasceu desses mesmos conflitos. Também hoje, a uma outra escala e numa vertente bem diferente, estamos num tempo em que só unidos sairemos da crise mundial em que estamos metidos. Para melhor enquadrarmos o que esteve na base da actual União Europeia, que tem passado por diferentes fases, uma melhores, outras piores, precisamos de recuar aos anos quarenta do século anterior, para, no meio dos destroços e muitos milhões de mortos, feridos e desalojados, descobrirmos o génio de homens de rija têmpera e verdadeiramente sonhadores que pensaram vir a conseguir uma nova plataforma de cooperação e entendimento que pudesse construir, em parcerias, um novo mundo e não destruir pela guerra a paz e a concórdia que devem sempre sobrepôr-se a tudo, em nome da vida e da dignidade da pessoa humana. Para que nunca se esqueçam, eis alguns dos nomes que levaram por diante esses nobres objecivos; Jean Monnet, Konrad Adenauer, Winston Churchill, Alcide De Gasperi, Robert Schuman e Paul-Henri Spaak, entre muitos outros. Como na base desses trágicos conflitos, nomeadamente, o de 1939-1945, estiveram quase sempre a motivação e egoísmo económicos, opondo dois eixos, o dos aliados à Alemanha e seus apêndices, houve, de imediato, que pôr travão à luta pela posse dos minérios, o que abriu portas à constituição da CECA – Comunidade Económica do Carvão e do Aço, no ano de 1951, a abranger os esforços e a coragem da França, Alemanha, Bélgica, Itália, Luxemburgo e Países Baixos/Holanda. Estavam dados os primeiros passos para a afirmação de uma nova era. Tudo tem uma matriz e aquela que foi a força básica para esta nova e determinante postura teve a ver com um famoso discurso, o de Robert Schumann, em 9 de Maio de 1950, o Dia da Europa, em que se incitou a que a Alemanha e a França pusessem em comum os seus recursos, o que foram os alicerces da futura CEE. Pouco tempo depois, em 1955, avançou-se para a integração de toda a economia, culminando esta caminhada com o arranque da referida CEE, através do Tratado de Roma, em 25 de Março de 1957, com os países já referidos, os pais do Mercado Comum, que haveria de revolucionar a Europa e até o mundo, na medida em que apareceu um tabuleiro diferente no xadrez global. Numa escalada gradual, foi-se erguendo o alto prédio que estamos a coabitar, desde os seis iniciais grandes mosqueteiros até aos 28 países de há dias e aos 27 de agora, depois da saída do Reino Unido, por via do Brexit de que ainda pouco sabe em termos de feitos futuros. Bons não são eles, pensamos nós. Pelo meio, entre avanços e recuos, sempre com a mira voltada para o aprofundamento das várias liberdades e da criação da união aduaneira, que são a pedra de toque deste projecto europeu, surgiram os diversos acordos e Tratados, como o de Lisboa, sem esquecer o de Maastricht (União Europeia – UE), o de Nice, o de Amsterdão, o Acto ìnico Europeu, o Acordo de Schengen, etc.... Num edifício complexo a todos os níveis, podemos encontrar, na sua orgânica, uma estrutura assente em pilares muitos diferentes e complementares, designadamente a Comissão Europeia, o Conselho Europeu, o Parlamento, eleito directamente desde 1979, o Tribunal de Justiça, o Tribunal de Contas, o Banco Central Europeu (BCE), desde que apareceu o Euro, o Banco Europeu de Investimento, o Comité das Regiões, as agências especializadas e outras valências e serviços. Sob o Hino da Alegria comum e uma Bandeira, em fundo azul com doze estrelas, os múltiplos interesses desta vasta união são apreciados e decididos nas instâncias que acabámos de citar, numa certa transferência de soberania que os Estados-Membros para ali transferem. Estamos numa nova “Hora da Europa” Perante uma crise que se abateu sobre todos nós, desde a China à América, não poupando praticamente todos os países do mundo, esta Covid 19 fez soar as campainhas de alarme por aqui e por todo o lado. A doença e seus efeitos colaterais, devastadores e imprevistos, cujo alcance ainda nem se conhece bem, têm obrigado a que se repense tudo. Se cada estado tem pensado e agido um tanto pela sua cabeça, a União Europeia, se forem em frente os programas e os pacotes financeiros que estão arquitectados, soube mostrar que comprendeu, para melhor, velhas lições. Se, na crise de 2008/2011, deixou que tudo descambasse para a hecatombe financeira e económica, que no caso português, grego, irlandês, espanhol, italiano e outros países, a todos levou ao charco, fazendo disparar os juros e o peso das dívidas de uma forma brutal, agora parece que foram encontradas as vias que fizeram dar as mãos em vez da teoria cínica e desastrosa do “salve-se quem puder”. Em Portugal, por exemplo, ainda hoje pagamos essa dor, em virtude de uma Troika que nos amarrou da cabeça aos pés e nos deixou de rastos. Como esta Covid 19 espalhou a morte e a destruição por todo o lado, as respostas europeias, como se pode depreender das palavras da Presidente da Comissão, quando fala numa nova “Hora da Europa”, estão a trilhar outros caminhos diferentes, em que se notam a cooperação, a solidariedade e a partilha de responsabilidades em conjunto, se os quatro países não teimarem em levar por diante as suas complicadas posições individualistas. Prevê-se a entrada em cena de fortes bazucas, uma delas de alto calibre e alcance como a que é empunhada pela CE com um pacote de 750 mil milhões de euros, grande parte em subvenções e outra fatia em empréstimos mas de pagamentos suaves e algo leves, numa espécie de mutualização da dívida. Se o último Conselho Europeu andou um pouco aos solavancos (depois de este trabalho ter sido escrito), felizmente notou-se que o bom sendo foi ainda a tónica dominante. Devem juntar-se-lhe as verbas dos quadros normais, mais os montantes vindos do BCE e do Euro e outros fundos, podendo dizer-se que tudo isto supera o conhecido Plano Marshall dos anos quarenta e cinquenta que foi então algo de outro mundo. Desta feita, a escala nem é dessa dimensão, porque vai além de todas galáxias que se conhecem. Impõe-se, agora, uma exigência, a que não estamos, infelizmente, muito habituados: saber usar estas “pipas de massas” em nome do bem comum, de bem conseguidas políticas de coesão, de uma transição justa a nível climático, da modernização da nossa economia, da sua digitalização, de uma criativa educação e formação, de um desenvolvimento industrial e agrícola capaz, de um comércio e serviços à altura dos desafios dos novos tempos, de um turismo que saiba ler e ver os novos sinais, do aproveitamento consciente dos nossos recursos e meios, em terra e no mar. Em suma, de uma modernização a toda a linha, que não esqueça o homem, o ambiente e o dia de amanhã, porque temos a obrigação de lutar pelo bem- estar das novas gerações, um outro dos lemas em que estes dinheiros e projectos se inserem. Para um país, uma Europa e um mundo mais responsáveis e solidários, não basta que haja dinheiro em cima da mesa. É preciso é sabermos bem o que fazer com ele. Para quê, para quem e com que meios. Ou seja: com a cabeça e o coração a funcionarem em conjunto e a pensarem na defesa das pessoas. De todas as pessoas. Com os olhos postos na recuperação a curto prazo, muito necessária e urgente, é para o futuro que temos de apontar estas boas munições, não as das guerras que originaram a CEE, mas as da paz que nos ajudarão a criar um mundo novo, este nascido das cinzas e das devastações desta terrível Covid 19... Carlos Rodrigues