terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Intempéries

Com a natureza não se brinca Das medidas que os homens vão engendrando, quer gostemos ou não, ao menos podemos contestá-las e até vociferar um pouco, se tal for visto como conveniente. Quanto àquelas que a natureza, senhora e rainha de seu nariz, nos oferece, nada melhor que calar o bico e, se houver necessidade, acorrer às chamadas no sentido de minorar estragos, prejuízos, quem sabe se pessoas feridas, mortas ou desaparecidas. Esta é a verdade que não sofre contestação. Estes últimos dias, com destaque para a noite e dia de sábado passado, foram de grande violência quanto a ventos, chuvas e neves. Um pouco por todo o país, com manchas onde estes fenómenos mais se fizeram sentir, houve razões de queixa e nada se pôde fazer. Honra, porém, seja feita aos serviços de Meteorologia, que não se cansaram de pôr à nossa disposição sérios e bem fundamentados avisos, que se vieram a revelar de grande utilidade. Com as cautelas que daí advieram talvez muita coisa possa ter sido salva e muitas perdas de vida evitadas. Mas nem todas: ao que sabemos, assistiu-se a uma morte em consequência das condições atmosféricas adversas, na zona de Abrantes, havendo ainda a registar 21 feridos, 46 desalojados, fora outros números que as fontes não conseguiram obter. Em termos desta nossa região, sendo vários os prejuízos materiais, mas não de grande monta, convenhamos, há a lamentar, no momento em que escrevemos estas linhas, o desaparecimento, em Vouzela, de um Irmão marista, talvez fruto de qualquer fatal acidente relacionado com esta intempérie. Sem mais dados, por enquanto, este é um episódio que pode tornar mais negra a história destes dias de temporal. Oxalá que possamos estar enganados, mas, como diz o nosso povo, onde há fumo, há fogo. Infelizmente. Olhando para o mapa das ocorrências, há culturas altamente danificadas, Póvoa de Varzim, Vila do Conde, Esposende, Oeste, assim como árvores derrubadas, sendo um dos pólos mais graves o da Serra de Sintra com mais de duas mil caídas, muitas delas com centos de anos. No meio disto tudo, depois de uma noite de uma dura luta entre a limitação das forças dos homens e a bravura de uma natureza com “quem” se não pode nem brincar, esta saiu vencedora. Levando à sua frente tudo aquilo que mexia e que estava quieto, desde postes de electricidade e de telefones a muros e ribanceiras, estufas, telhados, chaminés, casas e as citadas plantas de grande e médio porte, também os rios começaram a não se contentar com os seus limites e toca de fugir para a rua e para as margens, assim como o mar. Enfim, esta foi, sem dúvida, uma das mais pesadas acções de tempos adversos nos últimos anos. Por aqui, outras situações têm vindo a acontecer, sem esta se lhe poder comparar, entre as quais se inclui o ciclone de 1941 que foi, esse, muito maior e mais destrutivo, tal como se registou no nosso jornal em 15 de Março desse mesmo ano: “…O dia quinze de Fevereiro findo foi, entre nós, de inverno rigoroso, nada fazendo, no entanto, prever o que se iria começar (sic) no começo da noite! Cerca das 18 horas, o vento começou a soprar com mais violência. Das 19 para as 20, o vendaval atingiu o seu auge, assim se mantendo algumas horas, horas que foram de angústia e pavor… Ao amanhecer do dia 16, deu-se a romagem aos campos sendo desolador o estado em que se encontravam… “ Com tudo isto, bem se pode dizer que, ontem e hoje e, com toda a certeza, no futuro, a natureza não se confessa e mostra-se total e globalmente quando, como e onde quiser. Fenómeno que o homem não controla, por mais que tente, a este cabe apenas - e já não é pouco - minimizar, na medida do possível, os seus efeitos. Foi o que aconteceu depois da noite de sexta para sábado e na manhã deste dia 19 de Janeiro, quando os Bombeiros, os funcionários das Câmaras Municipais, da EDP, da CP, da PT e populares puseram pés a caminho e mãos à obra, tentando reparar os prejuízos encontrados. Gente brava esta, a quem temos de estar gratos por tudo aquilo que fizeram e ainda estão a levar a cabo. A par de tudo aquilo que acabámos de descrever, também o mar não esteve com meias medidas e aqui a pouca distância, em S. Jacinto, um barco acabou por encalhar, felizmente sem males maiores. Desta forma, se com as posições tomadas pelos homens, há sempre um eventual meio de evitar estragos de monta, com a Natureza o caso muda de figura: com ela, repetimos, não se brinca nem se lhe pode perder o respeito. Isto se comprovou, uma vez mais, no fim de semana que acabámos de viver. Viu-se. Carlos Rodrigues

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