segunda-feira, 26 de março de 2018

Floresta e madeiras

A floresta e as madeiras em debate As nossas florestas e matas mostram-nos, em quase todo o lado, quadros de tristeza, de negrume e, agora, de um sentimento de vazio em função dos cortes, em massa, de árvores que estão a ser feitos um pouco por todo o lado. Ao olharmos para elas, sentimos como que um sentimento de uma orfandade muito especial: falta-nos qualquer coisa insubstituível. Se Lafões é assim, desde o mar à Serra da Estrela as variações são muito poucas, para não dizermos nenhumas. Nesta imensa catástrofe, nada ficou como dantes. A opinião de quem trabalha nestes sectores Muito ligada a estes sectores, a família Machado começa de sentir alguns apertos (como nos relatou Sérgio Machado, da terceira geração), mas ainda sem problemas de maior. Com o corte de madeiras verdes fechado, neste momento trabalham apenas madeiras queimadas. Fazem ainda limpezas de várias áreas. Só que o valor comercial dessas madeiras é muito reduzido ou quase nulo. Com a desvalorização em curso e a racionalização nos postos de recolha, tudo se agrava. Não obstante estes condicionamentos, ainda têm conseguido os produtos de que precisam a nível nacional, mas as exportações para a Espanha estão na estaca zero. Frisa que deveriam existir incentivos às plantações em vez de tantas limitações. Fala nisto, disse-nos, até para não fazer desanimar os produtores florestais. Por sua vez, Laurindo Almeida, construtor civil, adiantou-nos que ainda não teve dificuldades em obter madeiras para as suas obras, servindo-se de serrações da região. No entanto, por se tratar de produtos queimados, já se notam alguns sinais de pinho “azulado”, sinal da sua menor qualidade, quando comparada com as árvores verdes. Com alguma capacidade em armazenagem, por ora, tem o problema resolvido, mas, no futuro, podem surgir alguns problemas. Mais ou menos afinado pelo mesmo diapasão, Miguel Marinha, da Teaga, alega que ainda não teve falta de matérias-primas. Teme, porém, que com as partes não ardidas a ficarem desertas também de árvores, haja, amanhã, reflexos negativos nas quantidades e nos preços, que podem vir a disparar. Para Carlos Cruz, da Casanova quanto a madeiras, de momento, ainda as vai conseguindo. O pior está na obtenção dos aglomerados e derivados, sectores em que se notam atrasos nos prazos de entrega e alguns custos mais caros. Dá, assim, duas explicações de sinal contrário. Por um lado, a construção civil vive uma boa onda, mas, em sentido inverso, a eventual falta de material pode acarretar problemas bem desagradáveis. Focado muito nos mercados de Lisboa e Porto, consome largos milhares de m2 em placas e uma a duas centenas de m3 em madeiras. Se estes materiais escassearem, não deixará de sentir dificuldades, que terá de vencer. Ainda há quem exporte Em Fataunços, José Carlos e José Manuel, pai e filho, ainda conseguem exportar para Espanha o fruto do seu trabalho: a madeira serrada e aparelhada. Nestes momentos, trabalham apenas também com pinheiro e eucalipto queimados. Até agora, ainda não tiveram problemas em escoar o resultado de seu esforço, que passa por comprar, cortar, serrar e encaminhar para os mercados. Dentro do país, enviam madeira para Estarreja, Águeda, Sever do Vouga, Oliveira de Frades e outras terras. Lá fora, é Espanha que absorve as suas matérias-prima. Trabalham na sua empresa sete pessoas, mas sentem que podiam absorver mais força manual, mas não aparece ninguém. 30 ou 40 toneladas por dia é quanto ali se produz. Paralelamente, operam ainda na área das lenhas, sobretudo de carvalho, mas esta componente bastante marginal em relação aos seus objectivos prioritários. Em termos de qualidade, tudo a bom nível. No dia em que aparecer furada a madeira de pinho e eucalipto, então há que rever tudo isso. Por enquanto, as preocupações, a esse nível, estão bem controladas. Nesta viagem pelo mundo das madeiras em tempos de pós-incêndio, o panorama ainda se vai mantendo em linha de conta com a qualidade que se deseja. Mas o futuro pode trazer mensagens bem piores. Oxalá que não. Outras pistas Para Pedro Pinhão, da Toscca, “é inquestionável que a indústria transformadora de madeira se vai debater no futuro próximo com escassez de matéria prima” Entende que a madeira queimada ainda pode ser usada, mas quanto ao seu ramo tal é impossível.. A seu ver, “existe espaço para floresta de lazer, de reserva, de pedagogia e também de produção. O nosso problema é a ausência de gestão, desordenamento generalizado e absentismo. Com pena a TOSCCA, cada vez mais dependente de importação de matéria prima e provavelmente menos competitiva em termos internacionais, está a procurar áreas para florestar em países como o Brasil, pois em Portugal não existem áreas que viabilizem investimento com massa critica para gerar abastecimento futuro: Nada fazer significa que não teremos madeira para o futuro próximo. È pena…. A floresta tem o seu tempo, ciclos de renovação lentos e nós (se não agirmos correctamente) perdemos a sustentabilidade.” Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, 22 Março 2018

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