quarta-feira, 2 de junho de 2021

Com as voltas por 1955, encontramos as migrações de Alcofra para o Alentejo...

Em 1955, migrar para o Alentejo era um costume anual Da tristeza do trabalho à alegria do reencontro com os seus conterrâneos Pela pena do Padre José João Pereira, tal como vimos no número passado, a saga dos alcofrenses, em idas sucessivas para o Alentejo e outros locais, nunca passava indiferente às gentes locais. Sem deixarmos de pensar que suas crónicas tinham uma certa grelha de leitura a que não era alheia a sua função sacerdotal, os testemunhos nelas revelado integram uma boa fonte de compreensão para este fenómeno das nossas migrações internas e dos quadros sociais de que faziam parte. Em concreto, a freguesia de Alcofra tem, no seu historial, um importante acervo do que foi a vida das nossas comunidades rurais. Nesta segunda fase da edição do jornal “Notícias de Vouzela”, não deixa de ser significativa a importância que concederam a estes fenómenos. Todos sabemos, ontem e hoje, que o jornalismo não é um exercício isento em termos de escolhas quanto aos temas a editar. Podem omitir-se uns e optar-se por outros. Estávamos em 1955 e a emigração talvez não fosse, nas altas esferas do poder, um assunto pacífico. Decidir dar-lhe honras de primeira página, deixem que diga, é um acto de coragem e um exercício de cidadania que nos apraz louvar. Convém ainda relevar-se a ênfase dada à forma como o Padre José João relatou os factos com um incrível realismo, bem evidente nos parágrafos que se seguem ( 1 de Março de 1955): “ De manhã, ao pontar do sol , estão no trabalho, que é diferente conforme a quadra do ano… À noite, regressam ao «quartel». Os «ruços» fazem o transporte da água e acendem o fogão. Cada qual faz a sua ceia, no mesmo género do almoço e avia alcofa para o dia imediato. Em seguida, conta-se, canta-se, dança-se até que o manajeiro mande recolher… “ No meio das durezas das tarefas diárias, nunca a alegria, até talvez como forma de amenizar aquilo que por ali viviam, ficava de fora dos corações destas nossas gentes. Estamos mesmo em crer que ampliavam o seu enriquecimento cultural, levando costumes beirões para o Alentejo, trazendo outros em sentido inverso. Tutelar, a figura do manajeiro era uma presença constante. De relógio em punho, era ele que punha e dispunha dos tempos de trabalho e de descanso. “Fim de Junho. Quando o sol, em brasa, tudo queima, lá voltam os «galegos», airosos, e «pategos», de grande manjerico na orelha, pena no chapéu e botas brancas nos pés. Por sua vez, as moças, de saia e blusa berrante, meia cento e um e sapato de lona, dão léria aos sete ventos. É uma animação. Dinheirinho fresco que chega, tabernas que se enchem, bailes que se organizam, balbúrdias nocturnas, mocidade que se queima… “. Após quatro meses, lá voltam à mesma vida…. Olhando-se para as vivências deste concelho de Vouzela, informa o Delegado Escolar, o Prof. Antero de Almeida, em entrevista, que por aqui se assiste à menor taxa de analfabetismo do distrito de Viseu e mesmo assim anda-se pela ordem dos 33%. Acrescenta que, de 1944 para 1954, aumentou em 45% o número de crianças matriculadas, passando-se de 1200 alunos em 1944 para 1750 em 1954 e de 31 para 36 escolas. Em 7 cantinas escolares, eram beneficiados 21 estabelecimentos, fornecendo-se cerca de 400 refeições diárias. Apoios assistenciais Num tempo em que as políticas públicas começavam de ter um certo peso social, ainda que muito longe do desejável e do que se ia fazendo por essa Europa fora (depois de se ter saído do horror da 2ª Grande Guerra), em subsídios de cooperação, a Misericórdia de Vouzela recebera 44 contos, o Hospital de Santo António de S. Pedro do Sul – 48, o Hospital de Nossa Senhora dos Milagres de Oliveira de Frades – 30 e a Misericórdia de Viseu – 332 contos. Quanto à distribuição do Fundo de Socorro Social, a Comissão Municipal de Assistência de Vouzela arrecadara 12 contos, o Asilo/Misericórdia – 6, a Comissão de Assistência Social de S. Pedro do Sul, 15, e a Cantina dos Pobres desta mesma localidade – 3. Para a Comissão Municipal de Assistência de Oliveira de Frades foram canalizados 6 contos, para o Albergue Distrital de Mendicidade – 108 contos e para a Comissão Municipal de Assistência de Viseu, 48 contos. Nestes tempos, anunciavam-se 301 novos encartados com cartas de condução em bicicleta, ficando 22 em espera por deficiências nas provas de sinalização. Como sinal de futuro, falava-se na criação das estações regionais dos CTT em Alcofra e Campia, mas advertia-se que se carecia de confirmação oficial, uma forma de bom jornalismo. Numa abertura para novos horizontes turísticos, a Agência de Viagens Novo Mundo publicitava novos destinos, tais como Caracas/Venezuela (bons tempos!), Nova Iorque e Congo Belga. E por hoje aqui nos ficamos… Carlos Rodrigues, In “Notícias de Vouzela”, Maio 2021

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