quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Reinventar o interior, NV, dia 31 de Julho de 2014

Reinventar o Interior Pela nossa percepção e por aquilo a que temos vindo a assistir, o interior português está em maus lençóis e pouca gente há que lhe queira valer. A sua recuperação já não se consegue com o voluntarismo de quem com ele sonha, nem com meias medidas, exigindo antes uma postura de estado, em acordo de regime, que leve a que se olhe para esta realidade de uma maneira totalmente nova e criativa. Não chega querermos vender capuchas e peças de artesanato, não basta ter-se uma ou outra empresa credível e a criar riqueza, é preciso reinventar tudo de novo. O Estado, por mais que se apregoe para aí que o mercado é que nos deve comandar, tem de entrar em acção e com força. Se isso não acontecer, este nosso País, a duas velocidades e a dois tempos, torna-se insuportável e injusto. Até estes dias, é o litoral (leia-se Lisboa, Porto e arredores) que concentra atenções, que absorve as fatias de leão de todo o investimento, que, usando a técnica da sanguessuga, nos fica com todo o sangue, nos vai comendo a carne e se prepara para nos roer os ossos. Se nada temos contra esses grandes Centros, a nossa mágoa, luta e frustração nascem desta evidência; para esses crescerem, mingou todo o restante território e isto é inaceitável. Sendo assim, agora e com uma visão de futuro, há que olhar para estas questões cruciais de uma outra maneira, porque as “… Políticas de desenvolvimento rural devem combinar estratégias globais com políticas territorialmente adaptadas e específicas…” – In” João Ferreira de Almeida - Debates, Presidência da República, Perspectivas de Desenvolvimento do Interior, INCM, 2ª edição, 1998, p.28”. Medir tudo pela mesma rasa não cria igualdade, faz disparar distúrbios regionais. É esta lição que os Governos têm de saber aprender. E aplicar. O nosso País está dinamitado de situações anómalas e nocivas da coesão social. O Acordo de Parceria 2014/2020 ou serve para combater estas chagas, ou será mais um embuste em termos de políticas públicas nacionais e europeias. Desta forma, ou se avança com medidas que façam despertar o Interior, ou teremos mais do mesmo, agravando velhas feridas e convertendo-as em doença crónica e mortífera. Precisamos de programas territoriais com gente dentro, temos de saber captar talentos, apoiando-nos nas nossas identidades, mas dando-lhes mais vida e mais VAB – Valor Acrescentado Bruto, ou melhor, mais poderosos Índices de Desenvolvimento Humano, que a estatística não pode ser a única balança a reger nossas vidas. De números estamos nós cheios. Queremos é outras visões, novos olhares e novos actores, em que sejam parceiros as pessoas, as entidades locais, a sociedade no seu todo, o Estado e quem vier por bem, com ideias de desenvolvimento endógeno, nascido de dentro para fora, que quem mande e imponha teses do diabo, vindas de cima, de corredores engalanados de plumas, já houve que chegue e não mais desejamos que nos atormentem. Com Expressos a demorarem, circulando por Viseu, sete horas e quinze minutos para ligar Bragança a Lisboa e cerca de nove horas perdidas e gastas para fazer o trajecto Miranda do Douro/Capital, estamos conversados e, numa linguagem fria, tramados de todo. Assim, isto não vai lá. Adoptando um conceito “IKEA”, passe a publicidade, ambicionando uma terra melhor todos os dias, importa conseguir-se uma estratégia de sustentabilidade 2020, com pessoas num planeta positivo. Actuamente, o que há contraria toda esta filosofia: foge-nos a gente, ficamos sem ninguém e o Interior teima em continuar a passar por caminhos de um negativismo quase total. Salva-se apenas a saudade, mas esta não nos sossega de todo, nem faz com que as nossas povoações regurgitem de vida, que é o que é mais urgente e mais necessário. Numa partilha de projectos e vontades, seremos capazes de fazer inverter estes tenebrosos quadros. Para se reinventar o Interior, como acentua o Presidente da República actual, são fundamentais os compromissos de longo prazo (Roteiros, 2014) e isso ultrapassa tudo aquilo a que, de momento, estamos a assistir. Com querelas partidárias e jogos floreados de poder, com a comunicação social toda virada para o BES e pouco mais, por mais grave que seja a sua situação, até nos esquecemos que está na hora de pensarmos em Portugal e, dentro de suas fronteiras, nas Regiões que tão abandonadas têm andado. Dito de outra forma: agarre-se no Acordo de Parceria e ponha-se este ao serviço da correcção das desigualdades que nos arrasam e nos matam de todo. Se assim não vier a acontecer, resta-nos o direito supremo à indignação. Mas é pouco, pouco demais. CR

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