quinta-feira, 16 de novembro de 2023

Torre de Vilharigues com séculos de história

Torre de Vilharigues em descoberta constante Carlos Rodrigues Com a associação da Torre de Vilharigues a D. Duarte de Almeida, conhecido como o Decepado do Toro (1476), está feita uma ligação que tem tudo para fazer despertar o apetite pelo conhecimento deste lugar lafonense com uma vista privilegiada para Vouzela, Termas e S. Pedro do Sul e parte da região de Lafões na sua matriz fundacional, com os Montes do Castelo e do Lafão, os dois irmãos, os alavoenis, em destaque. Esse é um de seus pontos fortes ainda que discutível sob o ponto de vista histórico. Mas há muito mais para saber e apreciar. Torre, castelo, casa-torre, atalaia, ou outra designação qualquer, desde que relacionada com esta área do saber, o certo é que esta edificação datada aí dos séculos XIII ou XIV, tem de ser vista como uma construção senhorial e /ou militar, um espaço de importância e de poder a mostrar-se a quem a possa ver e dela dependa, isto nos tempos medievais. Parceiras de caminhada e ainda de pé, temos as de Alcofra e de Cambra, sendo que outras, como a de Fataunços, apenas constam da memória e das páginas da história. No panorama destes equipamentos, em Vilharigues constata-se que a sua feição militar não pode deixar de ser analisada, face à sua localização, um local estratégico em termos de vistas e observação das redondezas, sendo, por isso, escolhido como posto de defesa e de eventuais ataques, a que se juntam os aspectos da sua construção, com os matacães e outros pontos associados com essa finalidade e ainda as pequenas aberturas e a solidez das paredes, com cerca de 1.30 metros de espessura, em construção com duas faces bem trabalhadas e, no seu interior, uma camada de pedras mais pequenas, travadas aquém e além para melhor solidez e robustez. Com aberturas apenas mais visíveis no terceiro piso e umas outras mais reduzidas ao nível do segundo, facilmente somos levados a supor que a componente de defesa ali se aplicou. A existência de seteiras e ameias completa este quadro. Assim sendo, não nos custa ver que aqui se viam feições militares. Desta forma, os citados matacães, elementos típicos dos castelos, a serem autorizados pelo próprio rei, como aconteceu com D. Afonso III (1248-1279) mas só usadas com D. Dinis (1279-1325), são disso uma certa e boa prova a sustentar essa tese. Se houve essa intervenção régia, esse é um sinal de que esta Torre teria sido aproveitada para essas funções, como se atesta pela sua raiz inicial e pelo facto de ter sido construída em cima de um morro de rocha granítica natural, pelo que a afirmação senhorial, como originária na sua edificação, sobre os bens e as propriedades em redor, a acompanha desde sempre. Juntam-se, neste contexto, duas vertentes que assim devem ser interpretadas. De acordo com as informações colhidas nos painéis que ali se colocaram há anos e de mais dados, mormente de Manuel Real e outros, podemos estabelecer para esta Torre e para as terras envolventes, quanto a seus senhores, as seguintes conclusões: - 1248 – Miguel Eanes, cavaleiro de Vilharigues, que veio a apoderar-se ainda de terras em Quintela de Ventosa; - 1288 – Foram seus senhores os netos de Miguel Eanes;- 1307 – Feira de Vouzela;- 1357 – Vasco Lourenço da Fonseca e mulher, Margarida Eanes, vendem a quintã e torre a Gonçalo do Monte, no reinado de D. Pedro (1357/1367);- 1367 – Doação a Diogo Álvares Pereira, filho de Álvaro Gonçalves Pereira; - 1385 – Sua morte na Batalha de Aljubarrota;- 1389 – Martim Vasco da Cunha doa Moçâmedes ao escudeiro Gonçalo Pires de Almeida;- 1393 – Feira Franca de Vouzela;- 1394 – Vouzela, cabeça do concelho de Lafões;- 1476 – Afonso Lopes de Almeida mora na Torre;- 1478 – É juiz da vila de Vouzela, concelho de Lafões;- 1493 – Infante D. Manuel, duque e Beja e Senhor de Lafões;- 1497- Fernão Lopes de Almeida, senhor da Torre, compra a Quinta da Cavalaria;- 1502 – Nomeado provedor e administrador das Caldas de Lafões e criação do Hospital e Couto das Caldas de Lafões;- 1506 – Privilégios da Feira de Vouzela;- 1513 – Duarte de Almeida aparece como sucessor na Torre e na Quinta da Cavalaria;- 1514 – Foral de Lafões. D. Duarte de Almeida, provedor e administrador das Caldas de Lafões Em termos de grande história nacional, três episódios há a reter: a ligação de Vouzela e Lafões à Batalha de Aljubarrota, à conquista de Ceuta e à Batalha do Toro, respectivamente em 1385, 1415 e 1476, sem esquecer os tempos de D. Dinis, D. Duarte, D. Manuel I e outros monarcas. No capítulo “ Os Almeidas de Vouzela” em que se divide a exposição colocada na Torre, mostra-se que estes viveram em Moçâmedes, Vilharigues e Figueiredo das Donas e ainda em Vouzela, Quinta da Cavalaria. Os primeiros dos “Almeidas” terão estado ligados no século XIV ao Paço de Moçâmedes, sendo que em 1389 Gonçalo Pires de Almeida recebe doação da terra e celeiro desta terra. Sua mulher, Inês Anes, chegou a ser ama-de-leite do Infante D. Henrique, pelo que esta ligação veio a dar os seus frutos pelos tempos fora. Assim, o filho do casal, João de Almeida, 2º senhor de Moçâmedes veio a ser escudeiro de seu irmão colaço, o Infante D. Henrique, com quem partiu para a conquista de Ceuta. Alguns anos mais tarde, em 1475, Vilharigues e a Quinta da Cavalaria associam-se a um outro ramo dos “Almeidas”, Afonso e Fernão Lopes de Almeida, que também se ligam a Figueiredo das Donas. Nesta marcha dos tempos, João Lopes de Almeida, herdeiro de duas tias, D. Catarina e D. Isabel, casa-se com D. Guiomar de Sousa, facto que levou a que este apelido tivesse vindo a ser consagrado posteriormente. Na musealização recente da Torre, o terceiro piso alberga um vídeo sobre este período da Idade Média de Vouzela e de Lafões e uns painéis sobre a Batalha de Toro e os Almeida, a par duma panorâmica geral para as paisagens exteriores, bem como a visualização da parte interna dos citados matacães. Na nossa tentativa de explicação de que esta Torre tem implícita uma pendente militar, é significativo que as grandes aberturas só apareçam bem lá no seu cimo, em sítio, nesses tempos, quase inatingível. Sendo este um senhorio de uma vasta área em redor, três casais, mais de um terço da aldeia, dependiam do dono da torre a quem pagavam uma renda/foro anual e prestações diversas em produtos agropecuários e braçais. Com o seu poder sobre a administração e a justiça, era assim vasta a sua importância, o que se manteve durante séculos, talvez até ao tempo do Duque de Lafões, século XVIII, um outro capítulo da história destas nossas terras. Carlos Rodrigues

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