sexta-feira, 13 de março de 2020

João Ramalho, um dos fundadores de S. Paulo, nasceu em Vouzela

Vouzela ofereceu ao Brasil uma alta personalidade I - João Ramalho, alguém com muita história e lenda, adorado em S. Paulo CR Aí pelos inicios dos anos de 1500, sem se saber quando, nem como, chegou ao Brasil João Ramalho, nascido e criado na vila de Vouzela, e nessas terras distantes deixou fama e obra, nem sempre por aqui conhecida, mas de extrema importância, por exemplo, para a história de S. Paulo e arredores. Personagem envolta em realidade e mistério, vamos tentar dar dele a imagem que merece, sendo de toda a justiça tributar-lhe a nossa admiração pelos seus feitos. À luz dos códigos sociais de hoje, muitos dos seus comportamentos não serão aceitáveis, mas o seu tempo era outro tempo e é assim que temos de analisar o seu percurso de vida. Se os seus feitos já estão bastante estudados e divulgados, com destaque para os meios académicos paulistas, são ainda inúmeras as dúvidas sobre a sua vida em Portugal. Sabe-se, apenas, pelas confissões recolhidas e pelas deduções efectuadas, que nasceu, como vimos, em Vouzela, talvez em finais dos anos de 1400, que era filho de João Vieira Maldonado e de Catarina Afonso de Balbode e casado com Catarina Fernandes das Vacas. Da sua restante família em Lafões, pouco ou nada ficou como testemunho para agora poder ser analisado. Nem foi ainda descoberta qualquer pista que nos conduza a indicar as razões que o levaram a emigrar, nem quando e como. Fala-se em várias hipóteses, tais como teria sido colono, náufrago, degredado, fugido à justiça, mas apenas há relato de que, em 1532, andaria pelos lados de S. Vicente, onde Martim Afonso de Sousa o encontrou e com ele estabeleceu uma série de contactos e parcerias. Acerca de sua estadia e funções, muito se tem escrito. Por exemplo, Rodrigo Garcia, em “ O «bárbaro» que salvou S. Paulo”, diz que “... A vida de João Ramalho é cercada de mistério”, enaltecendo, porém, o facto de ter sido “... Responsável pela aliança entre índios e portugueses (... ) e foi fundamental para a manutenção da vila de Sâo Paulo de Piratininga... “. Para este autor, os paulistas vêem-no como seu pai, patriarca local e dos mamelucos (filhos de brancos e índias) e o próprio fundador da paulistanidade. Esta última dimensão foi particularmente notória quando esta cidade assinalou os seus quatrocentos anos em 1900. Nessa época, de certa forma para rivalizarem com o Rio de Janeiro e com a própria linha de pensamento histórico vivida e posta a circular de que Pedro Álvares Cabral fora o grande descobridor do Brasil, os homens do Planalto de Piratininga agarraram-e a João Ramalho, vendo nele o seu herói e o seu fundador. Para esta corrente de pensamento, foi determinante o Instituto Histórico e Geográfico de S. Paulo, fundado em 1894, e todo o trabalho desenvolvido por uma série de historiadores, antropólogos e outros cientistas, todos eles irmanados no objectivo de quase “endeusarem” João Ramalho como seu patrono ilimitado. O que fez para chegar onde chegou Em trabalho académico (2006) por nós apresentado numa universidade de Lisboa, descobrimos; em Gilberto Freyre, uma frase que resume parte daquilo que foi o universo vivencial de João Ramalho por aquelas paragens: “... No Sul, onde aliás já se enontravam, prosperando, à custa do próprio esforço, povoadores do tipo de Ramalho e do bacharel de Cananeia, com grande progenie mestiça e centenas de escravos ao seu serviço, a colónia de S. Vicente foi oficialmente fundada em 1532... “. Entretanto, para Cristóvão José Moreira de Figueiredo, entre variadíssimos argumentos, acrescenta que “... Bastaria a conservação do nome do povoado que fundou (Santo André da Borda do Campo) e cujo paço municipal e cujas despesas custeou do seu bolso quando foi elevada a vila, em 8 de Abril de 1553, para lhe perpetuar o nome, mas é verdade que a sua vida tem mais amplo e profundo significado. É que a personalidade de João Ramalho é como que inseparável da idiossincrasia paulista e, porventura, também da própria fundação de S. Paulo.... “ Antes de continuarmos com mais capítulos em que pretendemos abordar a vida e obra de João Ramalho, anotemos hoje que, em ironia do destino, dois cidadãos vouzelenses tornar-se-iam personalidades de alto relevo em terras e polos opostos. Na Europa, o Padre Simão Rodrigues de Azevedo, um dos fundadores da Companhia de Jesus com Santo Inácio de Loyola e seu Provincial em Portugal durante vários anos, e, do outro lado do Oceano Atlântico, João Ramalho, que haveria de motivar acesa troca de correspondência, sobretudo entre o jesuíta Padre Manuel da Nóbrega e o Mestre português. O motivo para esses debates teve a ver com o estilo de vida de Ramalho no seio das comunidades índias, sendo como que um dos seus e dos maiores, convenhamos. Mas esse tema fica para daqui a uns dias... Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, Março 2020

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