segunda-feira, 29 de junho de 2015

Vouzela, uma vila animada e mimada

Nvouzela18jun15 Vouzela no centro de Lafões A meio da encosta do Monte Castelo e de seu irmão Lafão, que, juntos, segundo se crê, deram origem à própria designação desta Região, a de Alafões, ou Lafões, mais especificamente, fica a vila de Vouzela, a terra de Vaucella, com o Vouga aos seus pés. Com este Rio como sua marca, uma outra se lhe cola na perfeição, a da sua profunda ligação à Serra do Caramulo. Com uma grande antiguidade, a sua história está cheia de dados de extrema importância, daqui tendo saído alguns dos mais prestigiados obreiros do nosso passado nacional, local e regional e até em termos de além-mar. Sede de freguesia, por si só, desde há muitos anos, agora faz parte da União que congrega também Paços de Vilharigues, que, com sua Torre, nesta tem um bom farol, a indicar tempos de outrora, renovados recentemente, estabelecendo um bom diálogo com a Nossa Senhora do Castelo e com o Monte Gamardo. Partindo nós de uma recolha de dados que remonta a a 1889, esta terra de S. Frei Gil, D. Duarte de Almeida, João Ramalho, Padre Simão Rodrigues de Azevedo e Morais Carvalho, entre tanta outra gente de peso, distribuía-se então pela Vila, Igreja (sic), Valgode, Caritel e os casais de Linhares, Cabrela, Ribeirinha, Candeeira, Pombal, S. Paio, Foz, Crujo, Ermida, Cavada, Pinheiro, Matas e Costeira, contando ainda com as Quintas da Sarnada (?), Continha, Lamas, Costeira, Matas, Regadas, Caritel, Poldras, Portelo, Porto-Salto, Cavalaria, Valgode, Avelar e Linhares, falando-se apenas da freguesia dessa época. Na vila, duas praças, a de Cima, a Velha, e a de Baixo, a Nova, rivalizavam entre si, isto é, a Praça da República e o Largo Morais Carvalho eram os centros que aqui se distinguiam. Entre estes espaços e a Igreja Matriz, ficava o Largo da Corredoura, local da Feira de então, pensando nós de que se trata da actual Alameda. Por estes sítios, ganhavam o seu sustento alguns comerciantes, dois farmacêuticos, ferreiros, serralheiros, sapateiros, alfaiates, havendo ainda oficinas de tecelagem de panos de linho, de estopa e burel, quatro fornos de poia (pão) e pisões nos Rios Vouga, todo o ano, e no Zela, em época de fortes caudais. Com uma boa centralidade política, a associação, por exemplo, do Pai de S. Frei Gil à corte e à “Câmara” de Coimbra, de D. Duarte de Almeida aos homens do D. Afonso V, de João Ramalho à colonização do Brasil, do Padre Simão de Azevedo à fundação da Companhia de Jesus e de Morais Carvalho à fina flor do Liberalismo fazem com que todas estas evidências sejam disso um testemunho indesmentível. Num tempo em que os aspectos religiosos também andavam de mão dada com as forças políticas, justificam-se as Igrejas e Capelas que por aqui foram existindo ao longo dos tempos: Igreja Matriz, da Misericórdia, de S. Frei Gil, Capela de Nossa Senhora do Castelo, de S. Sebastião, de S. João (Casa das Ameias, em preocupantes ruínas), de S. Pedro (Valgode), de Santa Catarina (Quinta da Sarnada). Em monumentalidade, porém, há muito mais a citar: Ponte, na Rua do mesmo nome, toda ela um património incalculável, Fonte da Nogueira, edifício da Antiga Câmara (Biblioteca Municipal), Museu Municipal, Estátua de Morais Carvalho, casas senhoriais e brasonadas, sendo por isso quase lícito afirmar-se que se está perante uma Vila-Museu. Assim sendo, se é importante valorizá-la e preservá-la, não menos determinante é, para um seu futuro sustentável, rasgar-lhe outros horizontes fora de muros, se assim se pode falar. Como é reduzido o espaço a ocupar, fiquemo-nos com estas datas e respectivas evocações, extraídas de um desdobrável das Festas do Castelo: 1093 – um dos primeiros documentos escritos sobre esta vila; 1307 – criação da Feira; 1436 – concelho de Lafões, D. Duarte; 1882 – estátua Morais Carvalho; 1885 – fundação dos Bombeiros; 1904 – ponte sobre o Rio Vouga; 1926 – Mercado Municipal; 1927 – extinção da Comarca, restaurada em 1973; 1929 – iluminação eléctrica; 1929 – Associação os Vouzelenses; 1931 – em segunda fase, Sociedade Musical Vouzelense; 1935 – Notícias de Vouzela; 1959 – Hospital da Misericórdia; 1962 – Colégio de S. Frei Gil; 1964 – Cooperativa Agrícola de Lafões; 1966 – Quartel dos Bombeiros/Prédio das Colectividades. Para se conhecer esta terra e toda a região de Lafões, entre muitos outros valiosos contributos que têm vindo a surgir, não podemos deixar de referir o papel do Professor Amorim Girão, que, em toda a sua vida académica, com uma notável obra realizada na Universidade de Coimbra, em torno da Geografia e da Arqueologia, sobretudo a partir dos anos vinte do século passado, se tornou pioneiro na divulgação da história e património destas nossas localidades de Lafões. Devem-se-lhe descobertas e análises registadas para a posteridade de um valor incalculável. Foi tal a sua importância neste campo científico que a atribuição de seu nome a um qualquer espaço, não perecivel no tempo, como uma sala da Biblioteca ou algo do género, seria uma boa ideia e um acto de justiça. Indissociável da região em que se insere, Lafões, nela sempre permaneceu, podendo até dizer-se que chegou a ser, em certa medida, um de seus lugares cimeiros. Por este facto, recebeu, por exemplo, uma das primeiras Misericórdias do País, mal D. Leonor criara em Lisboa, em 1498, esta preciosa Instituição. Com uma área de cerca de 193 quilómetros quadrados, tem hoje 9 freguesias por força de uma legislação algo sem pés nem cabeça, que, esvaziando ancestrais órgãos de governação local, fez desaparecer, integrando-as, as restantes três. Com essa medida, por mais que nos esforcemos em ver vantagens, muito se perdeu e pouco se ganhou. Mas em termos de perdas e fugas de serviço, corariam D. Dinis, D. Duarte e D. Manuel que tanto fizeram em aqui acrescentarem mais-valias, desde a Feira, já citada, a outras benesses. Cabe aqui uma palavra de muito apreço em louvor de todos aqueles – e muitos foram – que tanto fizeram pelo recuperação da Comarca, que teve, assinale-se, no então Governador Civil de Viseu (1973), Eng. Armínio Quintela, uma alavanca essencial. O mesmo se diga de quem fez erguer o velho Hospital, de construir um novo Palácio da Justiça que, depois de pouco mais de duas décadas de serviços prestados, está praticamente às moscas, em mais um desacerto governamental de todo o tamanho. Se uns tiram, outros semeiam e a vinda do IP5/A25 é um pilar essencial para o desenvolvimento deste concelho, que tem os melhores pastéis do mundo e é parceiro de um espaço onde podem pastar as nossas famosas vitelas de Lafões. Em matéria de equipamentos, importa também lamentar os cortes na Saúde, outra facada nas nossas costas que ainda sangra a bom sangrar. Já agora, diga-se que, ao falarmos de desaparecimentos cruéis, temos de recuar muito no tempo, porque o Covento aqui existente outrora quase não deixou rasto, o mesmo tendo acontecido com as muralhas do Castelo no sítio do mesmo nome. Triste sina é a desta terra. Ficam, no entanto, vivas e imortais as suas belezas e memórias, que ninguém mais vai apagar. Do passado recente, muito anda por aqui escrito. E dos tempos de outrora fica quase tudo por dizer, mas não é possível ir mais longe, por agora. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”

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