sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

Valadares. S. Pedro do Sul, cem anos de mudanças....

Valadares e seu ensino em cem anos de marcha Com o Rio Vouga aos pés e a Serra por companhia a subir para Manhouce, Valadares espalha-se, enquanto povoação e sede de freguesia, por cerca de três quilómetros de extensão na estrada que liga a EN 333 -3 à EN que une a sede do concelho, S. Pedro do Sul ao Porto, pela Serra. Com o sol por boa companhia, tem como um de seus símbolos, que partilha com a vizinha Sejães, as famosas e doces laranjas. Mas a sua riqueza maior está nas pessoas, na sua criatividade e vontade de fazerem progredir sempre a terra que é seu berço. Isso vê-se nas obras realizadas, nos sonhos concretizados, na alegria que transmitem com seus trajes e cantares, na solidariedade manifestada no seu Centro Social e em tantos outros aspectos de relevo, como, por exemplo, esta revista,“ Os ecos da Gravia”. Nestes breves apontamentos de hoje, seremos mais limitados nas nossas ambições, que passavam por querer falar da vida em geral desta comunidade de fronteira. Vamos, por isso, tentar encaixar apenas aqui algumas reflexões motivadas por cem anos de distância em termos de análise de seu ensino e alfabetização, precisamente no espaço temporal que vai de 1911 a 2011 e anos seguintes. As diferenças, como veremos, são como a água e o vinho. A primeira e triste constatação é que a população diminuiu a olhos vistos nestes cem anos de vida, começando com 1314 habitantes em 1911, para, no ano de 2011, último recenseamento efectuado, apenas termos aqui a residir 805 pessoas. É aqui que se enontra o maior dos problemas da nossa sociedade do Interior: um asfixiante e doloroso despovoamento, que, se não for travado a tempo e horas (e já ontem era tarde demais), ameaça a nossa própria existência, o que se verifica nesta freguesia e na grande maioria da área do nosso território português. Já agora, vejamos os números desde 1864 até 2011, desta forma: 1874 – 1060 habitantes; 1878 – 1105; 1890 – 1353; 1900 – 1300; 1911 – 1314; 1920 – 1429; 1930 – 1452; 1940 – 1483; 1950 – 1466; 1960 – 1587; 1970 – 1408; 1981 – 1285; 1991 – 1101; 2001 - 1007 e 2011 – 805. Estes valores falam por si. Dizem-nos, então, que o pico maior aconteceu no ano de 1960 e o menor apenas em 2011, há curtíssimos anos. Se, por aquilo que se sabe, talvez se compreenda a quebra que houve entre 1960 2 1970, a resultar do fenómeno das emigrações que esvaziaram as nossas povoações, levando as suas gentes por essa Europa fora e para as grandes cidades do nosso país, como Lisboa e Porto, em migrações internas dignas de nota, já custa muito a aceitar o que sucedeu de 1981 até à actualidade, em rombos sucessivos no tecido populacional. Podemos dizer que, apesar dos dinheiros europeus, da nova dinâmica autárquica, dos fundos vindos daqui e dali, dos muitos projectos aprovados e colocados no terreno, das novas vias de comunicação e equipamentos diversos, algo de grave falhou. Portugal não pode dormir descansado, a níveis dos órgãos do poder central e local, enquanto esta sangria se não estancar. Estando perto dum fatal hemorragia, este êxodo rural tem mesmo de acabar. Nem a UE deve deixar de olhar, em políticas do coesão, que já tem, mas que, pelos vistos, não funcionam, para esta terrível situação. Não sendo nós apologistas de quaisquer puxões de orelhas, porque cada estado membro tem a sua autonomia e a sua liberdade, o certo é que dos cofres comunitários vêm pipas de massa e é o que se vê: o erro tem de estar algures e nunca nesta nossa tão dedicada gente que tudo faz para resistir. Com este novo governo, parece que vamos ver estes espaços a tentarem dar a volta por cima, pois que agora estão sem sangue novo, com uma pirâmide totalmente virada ao contrário, o que se reflecte no encerramento das escolas e na abertura de Centros de Dia e Lares ou dos Serviços de Apoio ao Domicílio Instituído um novo Ministério, o da Coesão Territorial, a ter ao leme alguém que deu provas de conhecer esta triste realidade e de a fazer inverter, a Dra. Ana Abrunhosa, pode ser que outros e melhores caminhos venham a surgir. Se assim não for, então nem sequer sabemos o que fazer, que a falta de horizontes para os nossos jovens é enorme e gritante. É na busca desses seus sonhos que estará a chave da solução para estes problemas. Como? Com políticas públicas que encarem de frente a nossa salvação. Falemos agora de ensino A nossa intenção começou, em organização inicial deste trabalho, pela vontade de falarmos apenas do ensino e do que mudou neste período temporal de cem anos. Porém, ao olharmos para os números gerais que acabámos de expôr, não resistimos e lá fomos por outras estradas, as da nossa desgraça como aldeias sem grandes sorrisos infantis e cheias de lágrimas de quem vê os seus partir, tantas vezes sem retorno. Foquemo-nos, para já, no tema a que nos propusemos. Começamos por estranhar a dureza das palavras com que se descrevia a realidade em 1911, em alguns dos cinco parâmetros descritos em números, varões e fêmeas, assim mesmo. Mas contra isso nada a fazer. Foi o que foi e não é legítimo até fazermos comentários à luz dos nossos actuais valores e padrões de vida. Olhemos para as tabelas do campo da educação em 1911, relativamente a esta freguesia de Valadares: população residente – 1314 habitantes; analfabetos varões – 478; fêmeas – 710; sabem ler, varões – 113; fêmeas – 8. Dois aspectos se evidenciam de imediato: em primeiro lugar, uma disparidade e desigualdade de género verdadeiramente assustadora; seguidamente, notamos que o analfabettismo era uma realidade negra, muito mais quanto às mulheres. Não é, porém, uma diferença que se aplique apenas ao ensino, porque todos os aspectos da vida social mostram esses abismos entre os dois sexos, bastando, por exemplo, pensar-se que, ainda na década de sessenta do século passado, o voto feminino era altamente restritivo e que as mulheres, para se deslocarem para fora do país, tinham de ter uma autorização especial. Estendendo, agora, esta lógica ao concelho de S. Pedro do Sul, no seu todo, tínhamos, nesse mesmo ano, este panorama: 22550 habitantes; 6691 analfabetos varões; 11807 fêmeas; sabiam ler 2929 varões e 843 fêmeas. Se nos fixarmos em 2011, aparece-nos em Valadares uma taxa de analfabetismo de 7, 62%,, abaixo, porém, da média global do concelho que era de 9,05%, sinal de que são óbvios os progressos por aqui. Em jeito de comparação, anotemos: Baiões – 5,14%; Bordonhos – 6,63; Candal – 27, 68; Carvalhais – 6, 97; Covas do Rio – 25, 42; Figueiredo de Alva – 9,67; Manhouce – 18, 17; Pindelo dos Milagres – 12, 66; Pinho – 10, 47; Santa Cruz da Trapa – 7,67; S. Cristóvão de Lafões – 6,74; S. Félix – 11, 81; S. Martinho das Moitas – 23, 46; S. Pedro do Sul – 7,33; Serrazes – 5,74; Sul – 15, 24; Valadares – 7, 62; Várzea – 4, 2 e Vila Maior – 9, 36, tudo isto de acordo com o Diagnóstico Social de 2013 elaborado pelo Município. Sem qualquer lupa, salta aqui uma outra evidência: a desigualdade também se verifica notoriamente dentro das fronteiras concelhias, bastando analisar-se a disparidade existente entre a média geral e os valores muito mais altos do Candal, Covas do Rio e S. Martinho das Moitas, ou até de Manhouce e Sul. Assim sendo, há ainda muitas reflexões a fazer para além da dicotomia litoral – interior. Tendo Valadares, por essa análise, 7 crianças a frequentarem o Pré- escolar e 13 no Primeiro Ciclo, o panorama para o futuro continua a ser pouco animador em matéria de povoamento. Temos, mesmo assim, uma boa dose de confiança e esperança. Quando o Rei D. Afonso Henriques ligou Valadares, com o Covelo, ao couto do Mosteiro de S. Cristóvão de Lafões, lá tinha as suas boas razões. Não nos cabe a nós, de maneira nenhuma, dizer o contrário. Como bom vizinho, é isso que desejamos a toda a gente desta terra – Valadares. Que amanhã o sol continue a dar luz, muita luz, a esta freguesia do Vouga e da Serra da Gravia... Carlos Rodrigues, in “Ecos da Gravia”, Dez 19

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