sábado, 4 de fevereiro de 2017

Umas palavras há seis anos sobre um fotógrafo de eleição em Lafões

António Homem Cardoso de máquina em punho - I – Do começo à justificada fama A Europa estava a fugir de um de seus maiores pesadelos. Era o ano de 1945 e, em S.Pedro do Sul, ali para as bandas de Negrelos, nascia um rebento que bebera água de duas fontes, a de Vilharigues e aquela que jorrava na terra-natal de António Homem Cardoso. Filho de José Homem Cardoso e de Cristina Augusta de Almeida Cardoso, a criança de que vamos falar estaria longe de adivinhar o seu futuro. Com a vila à distância de um olhar, com o cheiro das águas sulfurosas das Termas por muito perto, estamos certos que eram o Rio Vouga e a linha do caminho- de- ferro, com a imponente ponte que estava a seus pés e os seus comboios, que fertilizavam os seus sonhos. Pelo meio ficariam a Senhora do Castelo e a Torre de Vilharigues, que o encantavam nas viagens familiares que então fazia. Mas a fotografia, cremo-lo, andaria arredada daquilo que lhe estaria reservado como uma promissora carreira, feita de acasos, contingências, empenho e veia artística. Só que a criança que, por volta dos dez anos, toma o caminho de Lisboa, a cidade que tudo suga, o eucalipto que seca qualquer verdura que queira singrar na região de Lafões e em todos os interiores ainda mais esquecidos, vem a escrever um livro de vida que serve de cartilha para quem acredite que ninguém pode ficar de fora de seus ideais se, para tanto, tiver engenho, força de vontade e um querer inabalável. António Homem Cardoso teve todos esses ingredientes em dose tamanha que conseguiu ser um dos nossos melhores fotógrafos. Ponto final. Já vimos que David de Almeida, seu e nosso conterrâneo, viveu um percurso algo semelhante. Saindo também de S. Pedro do Sul, ele que viu a luz do dia no ano do fim da Segunda Grande Guerra, a mãe mortal de todas as demais, tal como Homem Cardoso, criou um outro imenso edifício ligado a um distinto ramo das artes que, ressalvando as necessárias e intrínsecas distâncias, não deixa de ter similitudes, no seu ponto de partida, com o rapaz que se perdia de amores, a certa altura, por tudo quanto fosse máquina fotográfica. Por entre os intervalos de sua “profissão” inicial, aquela que estava reservada aos meninos que, cedo, deixavam de aprender e poder brincar, por se dedicarem ao mundo da vida atrás de um balcão, uma boa universidade prática, aliás, atirava-se António Homem Cardoso aos biscates. Ao virar de uma esquina, saiu-lhe a sorte grande e a respectiva terminação: ao aparecer-lhe, como que por magia, o actor Edie Constantine, vem a ser figurante num de seus filmes, precisamente “ Edie em Lisboa “. Fruto desse trabalho ocasional, angaria a verba que lhe permite comprar a sua primeira e querida máquina. Estava assim dado o pontapé de saída para um brilhante horizonte. Apaixonado por tudo quanto pudesse caber, com arte, na sua caixa de todos os segredos, tudo o mais viria por acréscimo. Porque o material precisa de ser moldado ao seu desejo e capacidade criativa, um outro salto era dado – a criação de um Laboratório, o que aconteceu na Quinta de S. Vicente. Agora, ao caminhar por estas avenidas de uma vida cheia de recortes que nem um se pode esquecer, sinto que me faz falta o calor de uma entrevista que tive o prazer de fazer num velhinho programa da então nascente Rádio Vouzela, de seu nome “ Olá, seja bem- vindo “ e que foi para o ar, durante anos, nas manhãs de domingo, sempre na companhia de Fernando Morgado. Recordo a força das suas palavras, o entusiasmo com que narrou toda a sua história, a carinho pela arte de bem fotografar, o amor pelas “motos”, o apreço pela sua Monarquia, a dedicação à família e tantos outros pormenores que, hoje, com pena minha, me fogem dos dedos como bolas de sabão. Restam-me muitas outras fontes, o que nem sequer é difícil em quem tem ao seu dispor toda uma biblioteca de muitas e boas informações. E a António Homem Cardoso não falta quem dele queira falar, porque bem o merece. É até, com um misto de receio, que me aventuro a fazer registar num jornal de sua terra – o Notícias de Lafões – estas simples considerações. Faço-o porque me mostrei interessado em mostrar quem assim sobe na vida e constitui, por todos os motivos, um orgulho para todos nós e um exemplo a apontar a quem nos lê. Se Edie Constantine lhe mostrou o céu onde deveria chegar, até o Serviço Militar serviu de suporte a essa finalidade, por aí ter tirado o curso de Operador de Fotografia e Cinema, artes que aperfeiçoou com Augusto Cabrita, que se esmerou por aplicar, a preceito, como fotógrafo oficial da Casa Real Portuguesa – pudera! – e que levou consigo, quando, por exemplo, tecendo um hino à democracia, tirou o retrato a Presidentes da República e a tantas outras altas entidades da nossa actual vida nacional. Por muito haver a narrar, aqui estaremos, muito proximamente. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, 2010

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