sexta-feira, 26 de abril de 2019

Egas Moniz e a sua ligação a Alcofra

EcosAbril2019 Alcofra não se esquece deste seu herói Egas Moniz, 70 anos depois do Prémio Nobel Médico e cientista, Egas Moniz, de seu nome completo António Caetano de Abreu Freire, que, em 1949, recebeu o Prémio Nobel da Medicina ex-aequo, tem profundas e maternais ligações a esta nossa região de Lafões. Educado por seu tio e padrinho, o Reverendo Caetano de Pina Rezende Abreu de Sá Freire, entendeu este juntar ao afilhado “Egas Moniz”, para vincar uma desejada costela mais nobre. Tendo nascido a 29 de Novembro de 1874, faleceu no dia 13 de Dezembro de 1955. Sua mãe, Maria do Rosário de Almeida Sousa Abreu, tinha raízes em Alcofra, na Quinta do Carril, sendo filha de Rafael de Almeida e Sousa, um lutador notável pela causa liberal no século XIX. Num ano em que se assinala o 70º aniversário de tão alta distinção, por esta zona preparam-se comemorações à altura da dignidade desse acontecimento. Figura multifacetada, Egas Moniz, dividiu a sua vida pela política, pela medicina e investigação, depois de ter andado de um lado para o outro em termos de formação académica. Entalado entre dois pólos sociais e políticos antagónicos, da parte da família de seu pai havia uma clara inclinação para posições absolutistas, enquanto que os ares de Alcofra levavam para direcções totalmente opostas. Consta que seu avô materno nunca se deu por rendido à ideologia vivida na mansão do Marinheiro, sempre que ali se encontrava o avô paterno. A certa altura, seu avô Rafael chegou a ter este desabafo: “Não pertenço a esta Casa, não respirei este ar de planície, menos agreste e menos excitante do que o da minha Alcofra”. Assim o confessou o próprio Egas Moniz na sua grande obra literária, páginas 383/384. Se Alcofra lhe era terra querida, em Avanca passou a sua infância. Mas, desde cedo, foi viver para casa de seu tio, na altura Abade de Pardilhó. Aqui frequentou a escola do Padre José Ramos, tal como relata no seu livro “ A nossa casa”, do ano de 1950. Tinha, porém, na citada Casa do Marinheiro, hoje Museu, o local preferido para suas brincadeiras e momentos de férias. Entretanto, passou pelo Lobão, por Avelar, pela Torreira em banhos. Estamos convictos que a Alcofra, na sua infância e juventude, não veio muitas vezes. Caso contrário, tê-lo-ia dito no seu livro. No entanto, esta terra nunca por si foi esquecida e a ela voltou já mais maduro, como, por exemplo, em 1953, ano em que ali foi recebido triunfalmente, acabando por ser designado seu “cidadão honorário”. Já debilitado de saúde, dizem que, quando ali ia ou passava, pedia que lhe trouxessem um copo de água da sua Quinta do Carril. Entretanto a sua primeira vinda data do ano de 1939... Nestas suas andanças, a certa altura, vê-se confrontado com vários problemas financeiros no seu agregado familiar, que levaram à “hipoteca” da casa de Avanca e outros haveres, que o Tio veio a comprar e assim continuou nas suas mãos. Foi tão forte esse abalo que seu Pai, alegando não poder pagar os estudos de seus filhos, decide mesmo emigrar para Moçambique, instalando-se na Beira. Para agravar todo este quadro, a morte apanhou-o nessa terra distante algum tempo depois. Por ironia do destino, também Miguel, um dia, segue o mesmo destino e ali acaba por falecer, assim se juntando, no Além, a seu Pai. Na história de Egas Moniz em termos de carreira académica, citam-se os tremores antes do exame na Escola Conde de Ferreira, de Estarreja, onde concluiu a antiga quarta classe. Veio depois o Colégio de S. Fiel, no distrito de Castelo Branco (onde ficou com o número 66), da responsabilidade dos Jesuítas que”sabem ensinar”. E foi esta uma das razões que ali o levou. Outra, tinha a ver com o desejo de o verem seguir funções eclesiásticas. A certa altura, juntou-se a seu irmão Miguel, em Viseu, para prosseguir os estudos, dizem que para evitar gastos duplos, quando, como dissemos, as agruras económicas bateram à porta de sua família. Foi nesta nossa cidade que soube da morte de seu Pai, pelo que este já não assistiu à sua ida para Coimbra, nem à sua fulgurante carreira académica e política. A vida agitada de Egas Moniz Antes de se instalar em Coimbra, onde concluiu o seu curso de Medicina, tendo ainda sonhado com uma carreira militar (talvez recordando seu avô paterno), passou por várias peripécias, andando, como vimos, de um lado para o outro, com o tio-padrinho a ter sempre uma mão protectora. Sendo uma espécie de seu banco e ainda de seu irmão Miguel, muitas das decisões que Egas Moniz tomou na sua vida passaram pela opinião do Reverendo Caetano. Ao partir para a cidade dos estudantes no ano de 1891, este jovem, se leva a ideia de estudar, jamais deixou de se ligar às farras próprias desta academia, vivendo mesmo numa República com todo o ambiente que tal implica. Ele assim se confessa: “ Às quartas e sábados não se pegava num livro. Eram vésperas de feriado. Ia-se à Baixa ao Café do Marques Pinto, onde as arruaças aos caloiros eram insuportáveis, mas todos gostavam de ir... “. Para evitar males maiores, os “padrinhos” lá estavam para os ajudar sempre que a trupe os topava na rua. Entra aqui uma faceta de Egas Moniz que nem sempre é conhecida: o seu amor pela canção coimbrã, sendo conhecido do Hilário, o grande estudante do fado e natural de Viseu, que, aliás, haveria de morrer muito cedo. No curriculum do nosso conterrâneo, inscreve-se ainda que foi Presidente da Tuna e com este Grupo viajou muito por Portugal e pela Galiza, em espectáculos diversos. Concluído o curso (1899), sendo que, a meio, ainda pensou vir a ser Professor liceal, que só não avançou pelo facto de a sua família o ter disso desviado, iniciou-se uma notável carreira de cientista e de político. Tendo leccionado na sua Faculdade de Medicina, a certa altura saltou para Lisboa onde afirmou todo o seu valor. Em 1911, assume a Cátedra de Neurologia, já na capital, na recém Faculdade de Medicina. Foi a invenção de um procedimento neurocirúrgico, a leucotomia pré-frontal, que o haveria de guindar ao estrelato como médico e investigador. Com várias nomeações para Prémio Nobel, desde 1928 em diante, atinge esse objectivo no ano de 1949. Nesta área da medicina e da cirurgia, passou ainda por Paris e Bordéus. A propósito do seu Prémio Nobel, logo nesse ano, a Assembleia Nacional, pela voz dos deputados Lima Faleiro e Sousa da Câmara, presta-lhe uma grande homenagem. Em outros palcos, a sua figura recebeu as mais altas distinções, em condecorações, toponímia, centros de investigação em sua memória, tendo sido mesmo patrono de um Hospital com seu nome. A par destes feitos médicos, teve ainda uma forte passagem pela política, tendo sido fundador do Partido Republicano Centrista, Embaixador de Portugal em Madrid, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Presidente da Delegação Portuguesa na Conferência da Paz, após a 1ª GG, e um dos apoiantes de Sidónio Pais. Entretanto, em 1901, casara com Elvira de Macedo Dias, em Canas de Sabugosa, mas não chegaram a ter filhos, alegando Egas Moniz que, consigo, se acabara a sua linha familiar. Sofrendo a dureza da “gota”, suas mãos vieram a ficar de tal maneira deformadas que o obrigou a deixar de operar. A sua vida descreveu-a no referido livro “ A nossa casa” e mostra-se no Museu em Avanca, com muitas alusões à sua obra e ao seu amor pela arte ali exposta. Com imensa bibliografia onde se fala de si, nem toda ela é abonatória. O seu grande feito, a lobotomia pré-frontal, tem sido bastante criticado em vários círculos da ciência médica e cirúrgica. Seja como for, no seu tempo, a sua inovação foi de um valor incalculável, tal como se justifica com o Prémio Nobel que lhe foi atribuído. Por tudo isto, Alcofra está a mobilizar-se para assinalar os 70 anos deste feito, numa série de iniciativas que têm, inclusivamente, o Alto Patrocínio do Presidente da República, Professor Marcelo Rebelo de Sousa. Carlos Rodrigues

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