quinta-feira, 6 de junho de 2019

Os meninos e as meninas da Roda em Lafões....

A roda e as crianças não abandonadas à sua sorte Na toponímia de Lafões, mais concretamente na vila de Oliveira de Frades, temos destacada uma “Rua da Roda”, o que nos remete, em tempos históricos, para uma forma e uma prática de as pessoas se desfazerem das crianças, dos filhos não bem aceites, pelas mais diversas razões, desde a miséria à vergonha social. Com o coração talvez apertado, quem se abeirava das “rodas” para, pela calada da noite, depositar os meninos e as meninas num local que sabiam vir a ter um tratamento muito mais feliz e adequado do que as deixar numa qualquer esquina, ao deus-dará, tinha, quem sabe, a percepção de que estava a fazer uma dolorosa despedida, mas, talvez, sentisse que do mal o menos... Instituições necessárias no contexto social que se vivia, inseriam-se numa política de assistência social que assentava muito na sociedade civil e religiosa, pelo que estas Casas das Rodas dos Expostos cumpriam uma função, sendo que “No princípio da Época Moderna (....), a potecção das crianças indesejadas é feita, por motivos morais e religiosos... “ nestes serviço de apoio às comunidades, como se lê em “ As casas da Câmara dos Concelhos Portugueses e a monumentalização do poder local, séculos XIV a XVIII, Volume I, Carlos Manuel Ferreira Caetano, UN Lisboa, 2011” Depois de a Igreja assumir a parte de leão em matéria de assistência social, o que se verificou mais intensamente na Idade Média com as albergarias-hospitais e outros sistemas, a partir de certa altura as Ordenações do Reino, seguindo esta mesma fonte, faziam incidir nos concelhos estas e outras responsabilidades, a que se sucederam as Misericórdias em partilha de funções ou mesmo em passagem de testemunho. No que diz respeito ao meio local lafonense, a Santa Casa de Vouzela, em termos de actividade caritativa em tempos idos, inscrevia nos seus propósitos a “assistência aos pobres e aos mais necessitados, aos órfãos e aos meninos depositados na «Roda»”, assim como “cuidava dos enfermos e enterramento dos mortos”. Aliás, com Pina Manique estas matérias eram mesmo impostas oficialmente em todos os municípios, ou na Casa Pia de Lisboa. Por sua vez, no Arquivo Municipal de Oliveira de Frades são frequentes as referências a gastos com estas e outras funções de cariz assistencial, sobretudo no século XIX. Uma das actividades obrigatórias era a do “registo de entrada dos expostos” Em regime de 24 em 24 horas, as “rodeiras” tinham como missão a prestação de cuidados às crianças durante um período que poderia ir até três dias. Depois deste período, passavam para a alçada de amas “recrutadas e pagas pelos concelhos, até à idade de sete anos” (Ver livro atrás citado). Quanto à sua localização, em muitas situações optava-se por locais recônditos e periféricos, a fim de se manter mais o segredo ou o encobrir mesmo esses actos. Na referência à Rua da Roda, em Oliveira de Frades, pode-se, de certa forma, verificar algo relacionado com estas últimas condições, na medida em que a sua localização ficava um tanto em sítio menos visível a partir do centro urbano. Com o Estado, enquanto poder central de fora destes esquemas assistenciais, a mobilização, como estamos a ver, veio de outros lados e os concelhos foram essenciais nessas épocas. Hoje, tudo é diferente, para muito melhor, acentuamos nós. Mas temos também de confessar que as carências são ainda muitas e difíceis de debelar. Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, Junho 19

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