quinta-feira, 28 de maio de 2020

A floresta em Lafões Valor, queda, glória e trambolhões O mundo florestal tem passado por inúmeras fases ao longo dos tempos, no mundo, em Portugal e também aqui em Lafões. Dos matos bravios às plantações, de tipos diversos de exploração, desde baldios à propriedade privada, juntando-se-lhe o Estado em matéria de gestão e de controle, de tudo se tem visto neste importante sector da silvicultura. De repente, sobretudo nas últimas décadas, um inimigo implacável não lhe dá tréguas: o fogo. Por estarmos em Maio e com uma pesadíssima carga pandémica às costas, que nos tem consumido as energias até ao tutano, convém, mesmo assim, que nos lembremos que o Verão está à porta e, em cima de uma catástrofe, outras podem acontecer. Tendo em conta estes aspectos, vamos hoje dar uma volta pela floresta para melhor a compreendermos, estimarmos, defendermos e valorizarmos. Em tempos de controlado desconfinamento, estes nossos mundos de verdura e paisagens de sonho podem e devem ser aproveitados para o novo turismo que importa fazer renascer – o da natureza em todo o seu esplendor com muito e bom proveito. Mas, para que esses prazeres possam ser usufruídos, muito há a fazer e tanto de positivo já se foi perdendo, ano atrás de ano. Comecemos por um pouco de história, para melhor enquadrarmos este importante sector. Com a primeira Lei das Árvores a remeter-nos para o ano de 1565, só no ano de 1901 é que se fala propriamente no Regime Florestal, muito embora em 1864 já tenha aparecido o Ensino Superior Florestal e Agrícola. Entretanto, em 1875, fazia-se um balanço da área arborizada com cerca de 670000 hectares o que correspondia a 7% do território. Em 1965, esses números subiram para 2969000 ha de terrenos arborizados, ou seja, 33% da área total, sendo que, vinte anos depois, já tínhamos 3100000 ha, em 35% do espaço territorial. A grande mudança, porém, verificou-se no período do Estado Novo, sobretudo a partir dos anos 30 e 40, século XX. Determinante foi o Plano de Povoamento Florestal do ano de 1938, em que houve uma previsão para, em três décadas arborizar 420000 ha de área territorial, melhorar 60000 ha de pastagens, constituir reservas naturais e parques nacionais, construir 125 viveiros, 940 casas de guardas-florestais e 26 para adimistradores, 140 postos de vigia, 1159 telefones em 1800 km de rede, além de 2455 km de caminhos, como se pode ver no actual ICNF – Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas. Convém dizer-se que este processo de florestação nacional não foi nada pacífico, bastando para isso lermos o romance de Aquilino Ribeiro, “Quando os lobos uivam”, e a obra de Manuel Rodrigues, “ Os baldios, Caminho, 1987”. Aqui, anotam-se as lutas travadas nas Talhadas do Vouga, Castro Daire, Moimenta da Beira, Vila Nova de Paiva, entre outros episódios. Congratula-se este autor com a devolução desses terrenos aos povos, sobretudo pelos Decretos- Lei nºs 39 e 40/76 e a consequente constituição de 600 conselhos directivos de compartes no país, sendo 70 no distrito de Viseu, mas os recuos surgiriam nos tempos seguintes em termos legislativos e aplicações práticas. É preciso recuarmos, de novo, um pouco mais para, em 1886, assistirmos à criação dos mestres e guardas florestais, caindo-se, depois e muito mais tarde, na extinção destes serviços pelo Decreto-Lei 74/96. Posteriormente, em 2006, estes mesmos profissionais saem do Ministério da Agricultura para o da Administração Interna. No meio de tantas mudanças, em 1986, aparece o PAF – Programa de Acção Florestal, em 1996 a Lei de Bases da Política Florestal, mas, entretanto, tinha-se destruído um pilar essencial, a nosso ver, o do fim das casas dos guardas-florestais com obra feita e bem reconhecida. Em Lafões Numa vertente mais concreta, no que tem a ver com a nossa Região de Lafões, tomando como ponto de partida um estudo de Henrique Machado e Nuno Amaral (2000), podemos falar das seguintes áreas e aproveitamentos florestais em cada um dos concelhos: - Oliveira de Frades (OFR), ano de 1999 – 8750 ha de floresta, 59% do seu espaço; S. Pedro do Sul (SPS) – 11830/34%; Vouzela (VZL) – 9100/47%. Quanto a espécies, era este o panorama: - OFR – Pinheiro bravo – 5250 ha; SPS – 8050; VZL – 6720; carvalhos, respectivamente – 1050 ha/1190/1610; eucaliptos – 2380/1680/630; outras – 70/840/140. Já agora, acrescente-se que existiam 71 baldios em Oliveira de Frades, 42 – S. Pedro do Sul e 66 – Vouzela À vista desarmada, facilmente se constata que em eucaliptização se deu, de 1999 para cá, um notório incremento, recuando, no sentido inverso, as outras árvores. Já agora, anote-se uma realidade que chegou a ter um panorama destacada por estas terras, tendo perdido influência nas últimas décadas, estando agora novamente a recomeçar a dar um ar da sua graça. Estamos a aludir à resinagem. Nesta actividade, no ano de 1990, registaram-se as seguintes incisões e valores de produção em gema: OFR – 34900/ 2792 contos; SPS – 367600/36760 c; VZL – 162600/12195 c. É de notar-se que, no município de S. Pedro do Sul, houve ( e parece estar a reerguer-se) uma linha de produção de resina, na freguesia de Figueiredo de Alva, o que pode explicar a maior incidência deste sector neste mesmo concelho. Com outros proveitos, a floresta não se esgota no aproveitamento das suas plantas, tendo outros bens a oferecer, para além do inegável património paisagístico e ambiental. Pelo meio, há a caça e a pesca, a apicultura, o estrume, a lenha, as ervas aromáticas e toda uma variedade de bens que é difícil enumerá-los a todos. Com a implantação dos Perímetros Florestais e ainda com base naquela fonte, eram estes os números em causa: - Perímetro Florestal de SPS – 10298 ha de área total, sendo 5000 arborizados; Serra da Freita (apenas SPS) – 1190/625; Préstimo ( em OFR) – 300/280; Arca – 1582/920; Caramulo – 2890/694; Vouga – 456/456; Ladário (OFR) – 1620/1560; Penoita – 1278/495 Qaunto a casas de guardas-florestais, agora desactivadas e muitas em ruínas, eis o panorama em Lafões: - OFR – Covão, Ladário, Pedra da Broa, Lameiro Longo/Santo Adrião, Varzielas, Paranho de Arca. E ainda a Casa de Apoio, perto do Lagar dos Tombos. - SPS – Manhouce (2), Macieira/S. Macário, Pisãoe Sá-Carvalhais, Aldeia de Sul, Serrazes. Figueiredo de Alva, Negrosa (SPS) - VZL – Rocha, contando-se com um protocolo entre o Município e a Universidade de Coimbra para a instalação de viveiros florestais; S. Domingos ou Lameirão e Covas, estas pedidas para, em processo de descentralização, passarem para o domínio concelhio, para usos diversos, como albergues de montanha, por exemplo. NOTA – Ainda não tínhamos acabado este trabalho e já os incêndios atacavam no concelho de S. Pedro do Sul. Está dado o sinal: não se podem descurar as medidas preventivas que se prendem com esta nossa também triste realidade... Carlos Rodrigues, in “Notícias de Lafões”, 27 Maio 2020

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