quarta-feira, 27 de maio de 2020

Covid a dar cabo de tudo, desde a saúde ao turismo e à advocacia em Vouzela e por todo o lado

Covid ataca em todas frentes Da doença às sequelas sociais e económicas Estes meses têm trazido uma aprendizagem constante em diferentes domínios. Se a Covid 19, enquanto doença, pôs em acção a medicina e os laboratórios em apressada e dura caminhada para tratar esta inesperada enfermidade, a vida, fora desse contexto em que se joga o futuro da sociedade, é vista como um calvário difícil de ultrapassar e vencer. Quase tudo colapsou. Com meio mundo enclausurado, por precaução e por meio terapêutico, a economia escureceu, esfumou-se, foi mesmo ao fundo em alguns domínios. O turismo foi um desses sectores. Também a advocacia se viu em maus lençóis. Para tentarmos apalpar o pulso a estas actividades, ainda que sem contactos físicos por razões óbvias, contactámos com alguns dos seus protagonistas para deles obtermos testemunhos vivos e narrados na primeira pessoa. Com uma larga experiência em alojamentos locais no centro da cidade de Lisboa, ouvimos Carlos Alberto Fernandes, advogado, natural de Pereiras, Pinheiro de Lafões, residente, desde há décadas, naquela cidade. Por coincidência, milita também na mesma área da justiça João Ferreira, natural e residente em Vouzela, onde tem o seu escritório de advocacia, que abordou o tema da pandemia e os efeitos na sua profissão. No campo do Turismo de Habitação, escutámos Viriato Garcez, proprietário do Paço de Vilharigues, que nos deu a sua opinião. Damos o pontapé de saída nestas viagens pelas agruras dos tempos presentes com as palavras e as ideias de João Ferreira, que começou por nos dizer que, como advogado, sente a pandemia como um reflexo daquilo que acontece na vida de muitas outras pessoas e sectores, com momentos de apreensão e indefinição. A seu ver, esta angústia é tudo quanto se não deseja no mundo do direito. Sendo frágeis estes dias e meses para todo o ser humano, o jurista, enquanto profissional liberal com um caixa de previdência específica, tem sido duplamente penalizado, uma vez que, “numa crise absolutamente extraordinária”, não tem recebido quaisquer apoios ou regalias vindas do Estado. Com os julgamentos agendados suspensos, com muito e crescente desemprego, com as vidas em dificuldades, os advogados sofreram profundo abalo na sua actividade. Enquanto os tribunais não retomarem a actividade judicial, ainda que apenas numa “normalização possível” e reagendamentos à distância, ou presenciais, todas estas situações de carência se continuarão a verificar. Até tudo recomeçar em pleno, as dificuldades manter-se-ão, quase sem apelo, nem agravo. Sendo Delegado da Ordem dos Advogados em Vouzela, “ só posso esperar, para bem das pessoas que recorrem à justiça como forma de resolverem os seus problemas, que se possa alcançar uma normalidade tão depressa quanto possível, cumprindo-se, no entanto, escrupulosamente, as regras de distanciamento e de saúde pública, no respeito por si e pelos outros” Deixou ainda pertinentes considerações, como a da necessidade de uma justiça de proximidade, reclamando a permanência do Tribunal de Vouzela, e a necessidade de ser assegurado o acesso aos tribunais a todos os cidadãos, assumindo o Estado as suas funções constitucionais de apoiar quem mais precisa. Acrescentou que, em tempos de crise social, não podem, de maneira alguma, serem violados os direitos de cada pessoa, nem lhe pode ser amputada a possibilidade de se defenderem, caso venha a ser necessário. É para isso que existe a Justiça, realçou. A outra área que desejamos abordar tem a ver com um segmento económico que sofreu um verdadeiro e doloroso “tsunami” com o aparecimento e propagação em flecha do vírus da Covid 19, como veremos de seguida. O turismo sofre(u) a fundo os efeitos desta crise Com uma unidade de Turismo de Habitação, o Paço de Vilharigues, numa mansão do século XVII, recuperada e valorizada, Viriato Garcez confessou-nos que, a partir de 14 de Março, o mundo para si parou, caiu mesmo na estaca zero. De um momento para o outro, não teve mais clientes, viu serem canceladas todas as reservas, pelo que a sua taxa de ocupação caiu para o zero. Só soube o que era (re)abrir portas no passado fim de semana, em que já iniciou, muito timidamente, a retoma. Contou-nos até um caso curioso: recebeu umas pessoas que tinham anulado o respectivo casamento, mas quiseram assinalar a data, escolhendo este seu Paço. A senhora, para mais vincar a situação, ostentava no seu vestuário “Noiva Covid”. Lamentou ainda mais a situação de crise quando, disse, “este iria ser o melhor ano de sempre, com muitas reservas e lotação muitas vezes esgotada”. Tudo foi por água abaixo. Aos soluços, começa a renascer a esperança e já apareceram algumas reservas, até para os feriados mais próximos. Mas quase todos os interessados perguntam pelas regras de segurança, que “já temos em vigor, com mudança de hábitos e rotinas. Ao pequeno almoço, por exemplo, acabou o serviço de buffet, não há partilhas, mesas espaçadas, tal como acontece no exterior e muita higienização e práticas de segurança no pessoal e nas instalações” Mostrando-se algo animado, não deixou de mostrar algum receio quanto ao futuro, que demorarão a ser atingidos os níveis do passado – acentuou. Vive em Lisboa, mas é de Pereiras. Falamos de Carlos Alberto Fernandes, advogado, que optou ainda por investir, na baixa, no Alojamento Local. Até há meses, tudo ia em frente. Com a Covid 19, aconteceu o “verdadeiro pesadelo com reflexos avassaladores ao nível do turismo”. Durante anos, muito do progresso econonómico foi alavancado por esta actividade, sobretudo respondendo à procura de milhões de estrangeiros. Multiplicaram-se as unidades hoteleiras locais e novas apostas na modalidade que explora e nos hostéis, mais acessíveis a consumidores com menos recursos. A cidade inundou-se de vida e de movimento. O comércio floresceu. As casas foram recuperadas. Houve, não há dúvida, também efeitos colaterais, sendo um deles, como reconheceu, o da gentrificação. Agora, vivem-se tempos de desertificação, de dores de alma ao ver-se Lisboa quase vazia. O optimismo, no entanto, não desapareceu de todo, alegando que “... Creio que a tormenta vai passar. É apenas uma questão de tempo”. Até que isso aconteça, é preciso resistir e tentar conciliar o regresso do turismo com a “inalienável preocupação de segurança sanitária”. Esta parte da nossa História está a ser pesada até mais não. A somar ao cortejo das desgraças, um pesadelo continua connosco, teimosamente: o que poderá ainda vir a surgir? Com dúvidas e esperança, aguardemos e confiemos. Para não se cair no atoleiro, ao Estado cabe uma palavra decisiva. E que a UE não nos falte... Carlos Rodrigues, in “Notícias de Vouzela”, 28 Maio 2020

Sem comentários: