quarta-feira, 25 de setembro de 2019

A ponte velha e a nova em Sejães...

Duas pontes às portas de Valadares Uma mostra a sua imponência, outra hiberna de vez em quando Há muita história debaixo de água em grande parte do ano aqui por perto: sempre que a albufeira da Barragem de Ribeiradio trepa por aí acima, a Ponte Luís Bandeira, de Sejães, adormece nesse lençol imenso como seu cobertor de excelência. Felizmente que não desaparece. Ciclicamente, mostra toda o seu esplendor e carga patrimonial. Numa solução híbrida, para que se não perdesse a sua memória, este foi o truque encontrado. Uma outra solução pode, quem sabe, acrescentar-se a este método: retratá-la na barreira que ladeia a EN 333-3 e lhe fica em frente em plano mais elevado, acessível pela sua nova e imponente herdeira. Decorria o ano de 1906, quando, para unir as duas margens do Rio Vouga, ali para os lados da freguesia de Sejães, se pensou em construir uma nova Ponte. Tendo como grande impulsionador e patrono o General Luis de Mello Bandeira, de Souto de Lafões, que muito fez pela construção desta obra, da ideia passou-se à sua concretização. Pensada em moldes inovadores, seguiu, em parte, a tecnologia e o modelo da dita primeira ponte em “formigão de cimento armado”, a sua congénere de Vale de Meões, Mirandela, que já desapareceu há uns anos. Como esta se esfumou, esta ponte de Sejães como que pode afirmar-se como a mãe de todas aquelas que se lhe seguiram, tal como, muitos anos depois, lhe veio a “copiar” as linhas, ampliando-as, a da Arrábida, entre o Porto de Gaia no Rio Douro. Com base numa das muitas publicações em que se retrata este empreendimento, o “Estudo da Ponte Luiz Bandeira em Sejães – José Sena-Cruz e Rui M. Ferreira, Universidade do Minho, 2011”, chega a dizer-se que “ ... É considerada como sendo a mais antiga ponte de betão armado em utilização (?) no nosso país e uma das mais velhas da Europa... “. Foi projectada pelo Eng. Moreira de Sá, com construção a cargo da firma Moreira de Sá e Malevez, concessionária do sistema patenteado Hennebique de 1882. Com 44 metros de comprimento e 4.5 de largura, numa faixa de rodagem de 3 metros suportada por 2 arcos, nela se gastaram 15 a 16 toneladas de aço Bessemer e 60 m3 de betão, pesando o seu tabuleiro 167 mil quilos. Entretanto, no ano de 1951, em virtude da maior intensidade de tráfego, proveniente da EN 333-3, sofreu trabalhos de ampliação e reforço, de modo a poder responder, ainda que condicionadamente, às novas exigências que se lhe pediam. Ainda que assim tenha acontecido, nunca ultrapassou, até à sua colocação debaixo de água, as limitações que sempre a caracterizaram, até porque não permitia o cruzamento de dois veículos. Cerca de um século depois de ter nascido, eis que, com a construção da Barragem de Ribeiradio, que estendeu a sua albufeira até estas paragens, veio a sofrer um destino muito especial: não sendo morta, a opção passou por ficar submersa durante grande parte do ano, sempre que o nível da água, quer em NPA (Nível de Pleno Armazenamento), quer em alturas um tanto menores, não pode ser vista. Fora dessas épocas, pode ser observada e apreciada, esperando-se que assim aconteça por muito tempo, de modo a não se perder mais este ex-libris do nosso património. A este monumento, o Cónego José Fernandes Vieira, um conterrâneo desta freguesia e cidadão muito interessado pelas coisas da sua terra, nos seus “ Retalhos Histórico-Jornalísticos da Paróquia de S. Martinho de Sejães, 2015”, consagrou uma atenção muito especial. Alega que, com base em documentação que recebeu de Francisco Augusto Ferreira, da Casa da Telha, esta obra “... No ano de 1906, foi principiada (a ponte) no Piôco que esteve só com o arco de madeira e com os varões de ferro pousados dentro da madeira e veio uma cheia que levou tudo e um varão foi aparecer no Poço das Poldras de Baixo, que depois foi tornada a fazer e concluída no ano de 1907, dando meu pai Ricardo Ferreira para a construção dela 112 tábuas, que depois vieram algumas, mas poucas. Foi mandada fazer por Luíz Bandeira de Souto de Lafões...” Ainda a seguir esta fonte de informação, fala-se numa folha de ponto com mais de 40 nomes de pessoas que “ali trabalhavam”, como também pode ser comprovado no livro “Oliveira de Frades – António Nabais, Carlos Rodrigues e Manuel Martinho, edição da Câmara Municipal, 1991” em fotos e cópias diversas. Como estamos a falar de travessias do Rio Vouga nestes locais de Sejães e, de certo modo, de Valadares, a nova Ponte, agora em uso, tem 140 metros de comprimento, 33 de altura e 15 de largura, com passeios, de um lado e de outro, com 1 metro de largura. Abriu ao trânsito a 6 de Agosto de 2014. A pessoa de Luiz Bandeira De acordo com o Cónego José Fernandes Vieira, o General Luiz de Mello Bandeira teve as suas origens na Casa da Igreja de Souto de Lafões, tendo nascido a 16 de Março de 1844. Na Universidade de Coimbra, obteve as licenciaturas de Filosofia, Matemática e Engenharia, mas seria na carreira militar que haveria de seguir o seu destino, tendo atingido o posto de General de Artilharia. A par destas funções, foi durante 23 anos Par do Reino. Meteu-se assim na vida política, vindo a ser deputado pelo Partido Progressista pelos círculos de Viseu e da Madeira, terra onde se veio a casar com D. Eugénia Malheiro da Cunha. Tiveram dois filhos – Ema e Paulo Bandeira. Com forte influência, lutou pela construção da linha do caminho de ferro do Vale do Vouga, pela criação da Comarca de Oliveira de Frades, dedicando muita da sua atenção à Ponte de que temos estado a falar, a de Sejães. Das mãos do Rei D. Carlos, recebeu uma condecoração: a da Grã-Cruz da Real Ordem de S. Bento de Avis. Acabou por falecer na Praia da Granja, em 1913, repousando no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa. Por aquilo que fez, em sede de influência, o nome dado a essa “sua” ponte foi assim totalmente merecido. O seu a seu dono. E assim se cumpriu este ditado popular. Carlos Rodrigues, Ecos da Gravia, 2019

Sem comentários: